quinta-feira, 31 de maio de 2007

MINHAS PINTURAS



























Exposição Permanente:
Acrílicas Sobre Tela de Antonio da Costa Neto
Modalidade: Pintura Espontânea (feita diretamente com os dedos na tela).
Interessados Contactar:
(61) 3274 27 55
































HOMEM COMUM


Sou um homem comum,
de carne e de memória,
de osso e esquecimento.
Ando a pé, de ônibus, de táxi, de avião
e a vida sopra dentro de mim,
pânica,
feito a chama de um maçarico
e pode,
subitamente,
cessar.
Sou como você
feito de coisas lembradas
e esquecidas, rostos e
mãos, o guarda-sol vermelho ao meio-dia em
Pastos-Bons,
defuntas alegrias, flores, passarinhos
facho de tarde luminosa,
nomes que já nem sei
bocas, bafos
, bacias,
bandejas, bandeiras, bananeiras,
tudo
misturado
essa lenha perfumada
que se acende
e me faz caminhar.
Sou um homem comum
brasileiro, maior, casado, reservista,
e não vejo na vida, amigo,
nenhum sentido, senão
lutarmos juntos por um mundo melhor.
Poeta fui de rápido destino.
Mas a poesia é rara e não comove
nem move o pau-de-arara.
Quero, por isso, falar com você,
de homem para homem,
apoiar-me em você,
oferecer-lhe o meu braço
que o tempo é pouco
e o latifúndio está aí, matando.
Homem comum, igual
a você,
cruzo a Avenida sob a pressão do imperialismo.
A sombra do latifúndio
mancha a paisagem,
turva as águas do mar
e a infância nos volta
à boca, amarga,
suja de lama e de fome.
Mas somos muitos milhões de homens
comuns
e podemos formar uma muralha
com nossos corpos de sonho e margaridas.



(Ferreira Guillar)

quarta-feira, 30 de maio de 2007

SILVÂNIA, LINDA CIDADE!...


































































































































Fotos: Odinaldo Costa
Concepção e Montagem: Antonio da Costa Neto
Assistente de Arte: Marx Lamare Félix

domingo, 27 de maio de 2007

RECEITA PARA LAVAR PALAVRA SUJA


Mergulhar a palavra suja em água sanitária.
Depois de dois dias de molho, quarar ao sol do meio dia.
Algumas palavras quando alvejadas ao sol adquirem consistência de certeza.
Por exemplo a palavra vida.
Existem outras, e a palavra amor é uma delas,
que são muito encardidas pelo uso,
o que recomenda esfregar e bater insistentemente na pedra,
depois enxaguar em água corrente.
São poucas as que resistem a esses cuidados, mas existem aquelas.
Dizem que limão e sal tira sujeira difícil, mas nada.
Toda tentativa de lavar a piedade foi sempre em vão.
Agora nunca vi palavra tão suja como perda.
Perda e morte na medida em que são alvejadas soltam um líquido corrosivo,
que atende pelo nome de amargura, que é capaz de esvaziar o vigor da língua.
O aconselhado nesse caso é mantê-las sempre de molho em um amaciante de boa ualidade. Agora, se o que você quer é somente aliviar as palavras do uso diário,
pode usar simplesmente sabão em pó e máquina de lavar.
O perigo neste caso é misturar palavras que mancham
no contato umas com as outras.
Culpa, por exemplo, a culpa mancha tudo que encontra
e deve ser sempre alvejada sozinha.
Outra mistura pouco aconselhada é amizade e desejo,
já que desejo, sendo uma palavra intensa, quase agressiva,
pode, o que não é inevitável,
esgarçar a força delicada da palavra amizade.
Já a palavra força cai bem em qualquer mistura.
Outro cuidado importante é não lavar demais as palavras
sob o risco de perderem o sentido.
A sujeirinha cotidiana, quando não é excessiva,
produz uma oleosidade que dá vigor aos sons.
Muito importante na arte de lavar palavras
é saber reconhecer uma palavra limpa.
Conviva com a palavra durante alguns dias.
Deixe que se misture em seus gestos,
que passeie pela expressão dos seus sentidos.
À noite, permita que se deite, não a seu lado mas sobre seu corpo.
Enquanto você dorme, a palavra, plantada em sua carne,
prolifera em toda sua possibilidade.
Se puder suportar essa convivência
até não mais perceber a presença dela,
então você tem uma palavra limpa.
Uma palavra limpa é uma palavra possível.


(Viviane Mosé)

A FÁBULA DOS PORCOS ASSADOS


Uma das possíveis versões de um velho conto sobre a origem do assado é esta: certa vez, produziu-se um incêndio num bosque em que viviam porcos. Estes assaram-se. Os homens acostumados a comer carne crua, experimentaram e acharam ótimo. Então, cada vez que queriam comer porcos assados, punham fogo na floresta... até que descobriram um novo método. Mas o que eu quero contar é o que aconteceu quando se tentou modificar o sistema, para implantar um novo.

Fazia tempo que as coisas não andavam bem. Os animais se carbonizavam, às vezes ficavam parcialmente crus, outras de tal maneira queimados que eram impossível utilizá-los. Como era um processo utilizado em grande escala, preocupava bastante a todos, pois se o Sistema falhava em grande medida, as perdas ocasionadas eram igualmente grandes. Eram milhares os que se alimentavam dessa carne assada e também eram milhares os que se ocupavam dessa tarefa. Por tanto, o Sistema não devia falhar. Mas, curiosamente, à medida em que se produzia mais, mais parecia falhar e maiores perdas causava.

Em razão das deficiências aumentavam as queixas. Já havia um clamor geral sobre a necessidade de se reformar a fundo o Sistema. Tanto que todos os anos realizavam-se congressos, seminários, conferências, encontros, para se achar a solução. Mas parece que não conseguiam melhorar o mecanismo porque, no ano seguinte, voltavam a se repetir os congressos os seminários, as conferências e os encontros. E assim, sempre.

As causas do fracasso do Sistema, segundo os especialistas, deviam atribuir-se ou à indisciplina dos porcos, que não permaneciam onde deviam, ou à natureza inconstante do fogo, tão difícil de controlar, ou às árvores excessivamente verdes, ou à umidade da terra, ou ao Serviço Meteorológico que não acertava com a localização, o horário e quantidade de chuvas, ou a ...
As causas eram, como se vê, difíceis de determinar, porque, na verdade, o Sistema para assar porcos era muito complexo. Havia-se montado uma grande estrutura, uma grande máquina com inúmeros departamentos e ... havia-se institucionalizado. Havia indivíduos dedicados a pôr fogo, os “ignifier” das zonas norte, oeste, etc.; incendiador noturno ou diurno, com especialização matinal ou vespertina; incendiador de verão e de inverno (havia discussões sobre o outono e primavera), havia especialistas em vento: os anemotécnicos. Havia um Diretor Geral de Assamento e Alimentação Assada, um Diretor de Técnicas Ígneas (com seu Conselho Geral de Assessores), um Administrador Geral de Florestamento Incendiável, uma Comissão Nacional de Treinamento Profissional em Porcologia, um Instituto Superior de Cultura e Técnicas Alimentares ( Isceta), e o Bódrio (Bureau Orientador de Reformas Ígneo – Operativas). O Bódrio era tão grande que tinha um Inspetor de Reformas para cada grupo de 7.000 porcos aproximadamente.
E era precisamente o Bódrio que patrocinava anualmente os tais congressos, seminários conferência e encontros. Mas estes só serviam para aumentar a burocracia do Bódrio.

Fora planejada e estava em pleno desenvolvimento a formação de novos bosques, seguindo as últimas indicações tecnológicas, pois estes se situavam em regiões escolhidas segundo uma determinada orientação, onde os ventos não sopravam por mais de três horas seguidas, onde era reduzida a porcentagens de umidade relativa do ar, etc..

Havia milhares de pessoas trabalhando na preparação dessas florestas que logo deviam ser incendiadas. Enquanto isso, especialistas na Europa e nos Estados Unidos fiscalizavam a importação de melhores madeiras, árvores, toras e sementes. Outros, por sua vez, estudavam a maneira mais veloz e mais potente de fazer fogo. Havia, também, os que se dedicavam ao estudo de novas técnicas de como, por exemplo, fazer melhores armadilhas para pegar porcos. Havia, além disso, grandes instalações para manter os porcos antes do incêndio, mecanismos para deixá-los sair no momento certo e notáveis técnicos em alimentação suína.

Havia especialistas em construção de chiqueiros, professores de especialistas na construção de chiqueiros, universidades que preparavam professores de especialistas na construção de chiqueiros, pesquisadores que preparavam professores de especialistas na construção de chiqueiros e fundações que apoiavam os pesquisadores das universidades que preparavam professores de especialistas na construção de chiqueiros, etc.

As soluções que os congressos sugeriam eram, por exemplo, aplicar triangularmente o fogo na raiz quadrada de a-1, por velocidade de vento sul e soltar os porcos quinze minutos antes que o fogo médio dos bosques alcançasse 47 graus de temperatura. Outros diziam que era necessário instalar grandes ventiladores que serviriam para orientar a direção do fogo. E assim por diante. E, não é necessário dizer, pouquíssimos especialistas estavam de acordo entre si, e cada um tinha pesquisas e dados para provar suas afirmações.

Um dia, um “ignifier” categoria S-0/D-M/V-LL, ou seja, um incendiador de bosques, especialista sudoeste, diurno matinal, licenciado em verão chuvoso, chamado João Bom-Senso, disse que o problema era muito fácil de resolver. Tudo consistia, segundo ele, em que em primeiro lugar se matasse o porco escolhido, que ele fosse limpo e cortado adequadamente, posto em uma grelha ou armação sobre brasas até que, por efeito do calor e não da chama, ele ficasse pronto.

- Matar? Perguntou indignado o Administrador de Florestas.

- Como vamos fazer as pessoas matarem? Quem mata é o fogo, nós nunca!

Quando soube do acontecimento, o Diretor Geral de Assamento mandou chamar João. Perguntou a ele, que coisas estranhas andava dizendo por aí. Depois que o ouviu, falou a João:

- O que você diz está certo, mas apenas em teoria. Não vai funcionar na prática. Vejamos, o que você faz com os anemotécnicos, em caso de se adotar o que você sugere?

- Não sei, respondeu João.

- Onde você coloca os incendiadores das diversas especialidades?

- Não sei.

- E os especialistas em sementes, em madeiras? E os projetistas de chiqueiros de sete pisos, com suas novas máquinas limpadoras e as perfumadoras automáticas?

- Não sei.

- E os profissionais que ficaram se especializando no exterior durante anos e cuja formação tanto custou ao País? Vou pô-los a limpar porquinhos?

- Não sei.

- E aqueles que se especializaram durante anos na promoção de congressos, seminários e encontros, para a reforma e melhoramento do Sistema? Se sua solução resolve tudo, que faço com eles?

- Não sei.

- Você percebe agora que a sua não é a solução que precisamos? Você acha que se tudo fosse assim tão simples, nossos especialistas não a teriam encontrado antes? Vejamos. Quais são os autores em que você se baseou para fazer tais afirmações? Que autoridade está dando respaldo às suas afirmações? Você não pensa que eu posso dizer aos engenheiros anemotécnicos que a questão é usar brasinhas e não chamas, não é? O que faço com os bosques já preparados e prontos para serem queimados e que só possuem madeira para esse fim, pois suas árvores foram especialmente selecionadas porque não dão frutos e têm escassez de folhas? E selecionadas após anos de caríssimas pesquisas? Que faço, diga-me?

- Não sei.

Que faço com a Comissão Redatora de Programas de Assamento, com seus Departamentos de Classificação e Seleção de Porcos, Arquitetura Funcional de Chiqueiros, Estatísticas e Agrupamentos?

- Não sei.

- Diga-me, o engenheiro especialista em porcopirotecnia, Dr. J. C. de Figuração, não é uma extraordinária personalidade científica?

- Sim, parece que sim.

- O simples fato de possuirmos valiosos e extraordinários engenheiros em pirotecnia, indica que o sistema é bom. E o que faço com especialistas tão valiosos?

- Não sei.

- Viu? O que você deve trazer como solução, é como preparar melhores anemotécnicos, como conseguir mais rapidamente incendiadores de oeste ( que é a nossa maior dificuldade), como fazer chiqueiros de oito ou mais pisos em lugar de somente sete, como agora. HÁ QUE SE MELHORAR O QUE TEMOS. E NÃO MUDAR. Traga-me alguma proposta para que nossos estagiários na Europa custem menos, ou de como fazer um bom relatório para analisar profundamente o problema da reforma do Assamento. É disso que necessitamos. É disso que o País necessita. O que falta a você, Bom-Senso, é um pouco de sensatez. Diga-me, por exemplo, que faço com meu primo, o Presidente da Comissão para Altos Estudos e Aproveitamento Integral das Resíduos dos Ex-Bosques?

- Realmente estou perplexo, disse João, timidamente.

- Bem, agora você conhece o problema, não saia por aí dizendo que você o resolveria. Agora você vê que o problema é mais sério e não tão simples como você o imaginava. Quem está de fora sempre pensa: “eu resolveria tudo”. Mas é preciso estar dentro para conhecer as dificuldades. Entre nós, recomendo-lhe que não insista com essa idéia, pois poderia ter dificuldades com o seu emprego. Não por mim. Falo pelo seu bem. Eu o compreendo, entendo sua colocação, mas você sabe, pode encontrar um superior menos compreensivo e daí...

O pobre João Bom-Senso não disse nada. Sem se despedir, entre assustado e perplexo, com a cabeça rodando, saiu e nunca mais foi visto. Não se sabe para onde foi. É por isso que dizem que nessas propostas de Reforma do sistema falta bom-senso.

É claro que, numa visão superficial, parece que a fábula de Cirigliano retrata uma questão absurda. Mas imagine se o Dr. Bom-Senso fosse um pesquisador odontológico e se propusesse a pesquisar uma vacina anticárie? E se fosse um pesquisador da área de Psicologia e se dispusesse a criar um método que abreviasse as intermináveis terapias? Ou um obstetra com uma proposta de “despatologizar” o parto. Ou um jurista preocupado em acabar com o voto obrigatório. Ou se...

Não começa a parecer-lhe que a fábula dos porcos assados não é tão fabulosa assim?

Abaixo há algumas linhas em branco para você anotar algumas idéias que poderiam contribuir para o aprimoramento natural da área de conhecimento de sua atuação.

Propostas do Dr. Bom-Senso para a área do conhecimento:
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Seguramente até o final da leitura deste trabalho você se lembrará de algumas idéias que poderiam ser defendidas pelo Dr. Bom-Senso e sugeridas às instâncias coordenadoras de algumas áreas do saber humano oficial.

Você, leitor, deve ser especialista em alguma coisa. Se não for, seguramente estará desempregado ou sub-remunerado. A nova concepção a que nos propomos, não se destina a fazer com que você deixe de lado seu aprofundamento científico, seu aprimoramento tecnológico, nem, muito menos, que você deixe de ser especialista. Apenas tenta abrir-lhe perspectivas para uma visão mais ampla, abrangente e criativa e, sobretudo, libertadora dos proprietários da exclusividade do saber. Daqueles que fazem do seu conhecimento um sistema hermético, impenetrável, misterioso como um castelo mal-assombrado onde eles vagam como verdadeiras figuras fantasmagóricas, quase sempre supra-humanas.

Caso, entretanto, você não goste de analogias como a dessa pouco respeitosa fábula, pode encontrar na “douta ciência”, por exemplo, de Thomas Khun, que em “A estrutura das revoluções científicas”, mostra que se não houvesse homens com abertura intelectual, e principalmente mental, para buscar alternativas para a decadência do uso do conhecimento, até hoje o flogísto e o geocentrismo seriam aceitos como verdades intocáveis, pois um dia foram peças fundamentais no conhecimento tradicional.


(Texto de Gustavo Cirigliano com tradução livre de Teresinha M. Fogaça de Almeida)