domingo, 29 de maio de 2016

SOLUÇÃO POSSÍVEL PARA A CRISE BRASILEIRA #fatoseversoes






Passeando pelas teorias antropológicas esbarrei num conceito que chamou-me bastante a atenção que é a questão da zona de conforto. Ninguém quer sair dela e conforme explicam alguns antropólogos, os mamíferos e os animais de sangue quente são os maiores competidores no sentido de garantir a manutenção da própria zona de conforto.
E ainda, segundo a própria antropologia, que aqui peço licença para acrescentar uma nomenclatura ao terno: antropologia política, na sociedade capitalista, e, associando ao homem a capacidade de raciocínio e a sua posição nesta mesma sociedade, se acirrar, de forma rígida e brusca a zona de conforto de cada um.
Assim, na sociedade brasileira - como em todas as outras - quem representa o povo está numa zona de conforto absolutamente contraditória, ou até antagônica, e, assim, os esforços de ambos os lados são também contraditórios, impedindo, assim, resultados harmônicos para ambas as partes, beneficiando, sempre uma delas, que é a mais forte, a que comanda, a que domina.
Assim, quando políticos, parlamentares e seus auxiliares do primeiro escalão falam em resolver os problemas do Brasil, leia-se resolver os problemas da elite do Brasil, pois, como elite que são - pelo que ganham, o que comem, como moram e como vivem, etc. - tudo é feito, de forma subliminar para se resolver o problema da elite, se manter o poder de decisão e o poder de compra da mesma elite, não atingindo nunca, as massas, o povo, os trabalhadores.
Por isso, tais medidas nunca funcionam e o ciclo se repete desde tempos imemoriais e assim, sempre.
Neste domingo ouvi quando Cristiana Lobo terminou o programa dizendo que, na sua opinião, a crise brasileira só acaba com a eleição de um novo presidente. Reafirmo aqui que sim, precisamos eleger outro presidente, mas antes disto, repensar com profundidade quem seria este novo presidente? Qual a sua história de vida, seu passado, suas conquistas, enfim, sua realidade. O governo Temer, por exemplo - assim como o de Dilma, Lula, FHC, Sarney, Collor, etc. são, do ponto de vista ideológico, de perpetuação da zona de poder do próprio poder e do próprio Estado, são a mesma coisa. Ou seja, um governo feito dentro dos paradigmas da economia capitalista, centralizadora, opressora e, altamente, elitista e conservadora, nos sentido da manutenção do que aí está - ou seja, poucos dominando muitos - poucos com tudo e muitos com nada - o que é a síntese da crise e dos problemas que todos vivemos nestes tempos bicudos que nos cercam.
A montagem do primeiro escalão do Governo Temer já é, em si, de arrepiar, não só pelo escalão ser formado exclusivamente por homens brancos, mas todos elitistas experimentados, pessoas que estão há décadas, no bem, na boa e mamando no sistema e, claro, desta feita, vão continuar nos seus novos cargos, sedimentando formas de beneficiar a eles próprios e aos seus pares, o que cai no mesmo ciclo, na mesma exploração, nos mesmos valores. É, portanto, este o paradigma que precisa mudar, e, para tal mudança, tomo a liberdade de sugerir alguns passos:
1 - Para representar o povo o representante, governante, político, parlamentar, assessor, ministro, etc. não pode perder a sua similaridade com o povo. Claro. Não é mais possível se deixar de "ser povo para representar o povo." Então, é preciso que se repense a zona de conforto econômico-capitalista dos governantes, com o que já, começaríamos a repensar a questão do tesouro e das contas públicas. Quanto ganha um deputado, um senador, um governador, um secretário de Estado e quanto ganha um trabalhador do povo, um servidor braçal? Quanto vale um salário mínimo e quantos salários mínimos ganha um parlamentar? Sem repensar esta questão será eternamente impossível se resolver os problemas da crise brasileira, ou, até mesmo da crise mundial.
2 - Redefinição do caráter de quem governa. É preciso que os governantes de todos os níveis sejam selecionados criteriosamente num outro padrão de exigência em termos de caráter, personalidade, valores como a compaixão, a solidariedade, a ética em seu sentido pleno. Pois a ética que temos e que formula as políticas públicas é extremamente oportunista e fragmentária, como sendo uma "meia ética" que não enxerga o "crime do colarinho branco" e que fecha os olhos para as questões não palpáveis, que podem estar dentro da lei. Mas seria esta lei justa e legítima? Todos são iguais, de fato perante a lei ou existem os que são mais iguais do que os iguais e que são, eternamente, os mesmos.
Em síntese, é preciso uma verdadeira revolução econômica e ética na formulação das políticas públicas, criando, assim, uma nova perspectiva de uma ação governamental e de política, realmente, para todos e não só para os que governam, os que comandam, os que oportunizam a própria zona de conforto à revelia dos direitos de todos;
No meu blog: www.mudandoparadigmas.blogspot.com apresento algumas propostas como: a Metodologia do Planejamento Sistêmico-Contingencial; o Projeto de Novas Arquiteturas para a Gestão Municipal e o Projeto Pedagogia da Felicidade, que, acredito, possa ser uma dentre as infindas alternativas de solução que temos, mas que, para as quais, nossa elite ainda permanece completamente cega. Ou seja, perpetuando a estreita zona de conforto que precisa, necessariamente, ser ampliada para todos nós: somos todos brasileiros e não desistimos nunca.

sexta-feira, 27 de maio de 2016

É BRINCANDO QUE SE APRENDE - Rubem Alves






No meu tempo, parte da alegria de brincar estava na alegria de construir o brinquedo. Fiz caminhõezinhos, carros de rolemã, caleidoscópios, periscópios, aviões, canhões de bambu, corrupios, arcos e flechas, cataventos, instrumentos musicais, um telégrafo, telefones, um projetor de cinema com caixa de sapato e lente feita com lâmpada cheia d'água, pernas de pau, balanços, gangorras, matracas de caixas de fósforo, papagaios, artefatos detonadores de cabeças de pau de fósforo, estilingues.
Fazendo estilingues desenvolvi as virtudes necessárias à pesquisa: só se conseguia uma forquilha perfeita de jabuticabeira depois de longa pesquisa. Pesquisava forquilhas - as mesmas que inspiraram Salvador Dali - exercendo minhas funções de ´controle de qualidade´ - arte que alguns anunciam como nova mas que existiu desde a criação do mundo: Deus ia fazendo, testando e dizendo, alegre, que tinha ficado muito bom. Eu ia comparando a infinidade de ganchos que se encontravam nas jabuticabeira com o gancho ideal, perfeito, simétrico, que existia em minha cabeça. Pois ´controle de qualidade´ é isso: comparar o ´produto´ real com o modelo ideal. As crianças já nascem sabendo o essencial. Na escola, esquecem.
Os grandes, morrendo de inveja mas sem coragem para brincar, brincavam fazendo brinquedos. As mães faziam bonecas de pano, arte maravilhosa
hoje só cultivada por poucas artistas. As mães modernas são de outro tipo, sempre muito ocupadas, correndo prá lá e prá cá, motoristas, levando as crianças para aula de balê, aula de judô, aula de inglês, aula de equitação, aula de computação - não lhes sobra tempo para fazer brinquedos para os filhos. ( Será que as crianças de hoje sabem que os brinquedos podem ser fabricados por eles?). Hoje, quando a menina quer boneca, a mãe não faz a boneca: compra uma boneca pronta que faz xixi, engatinha, chora, fala quando a gente aperta um botão, e é logo esquecida no armário dos brinquedos. Pobres brinquedos prontos! Vindo já prontos, eles nos roubam a alegria de fazê-los. Brinquedo que se faz é arte, tem a cara da gente. Brinquedo pronto não tem a cara de ninguém. São todos iguais. Só servem para o tráfico de inveja que move pais e filhos, como esse tal ´bichinho virtual...´
Fiquei com vontade de fazer um sinuquinha. Naquele tempo não havia para se comprar. Mesmo que houvesse não adiantava: a gente era pobre. Como tudo o que vale a pena nesse mundo, a fabricação começava com um ato intelectual: pensamento: quem deseja pensa. O pensamento nasce no desejo. Era preciso, antes de construir o sinuquinha de verdade, construir o sinuquinha de mentira, na cabeça. Essa é a função da imaginação. Antes de Piaget eu já sabia os essenciais do construtivismo: meu conhecimento começava com uma construção mental do objeto. Diga-se, de passagem, que o homem vem praticando o construtivismo desde o período da pedra lascada. Piaget não descobriu nada: ele só descreveu aquilo que os homens (e mesmo alguns animais) sempre souberam.
Era preciso uma tábua larga e plana, flanela, madeiras e borracha de pneu de bicicleta para as tabelas; as caçapas seriam feitas de meias velhas. As bolas, de gude. Os tacos, cabos de vassoura. Preparei-me para fabricar o objeto dos meus sonhos. Meu pai, que era viajante, estava em casa naquele fim de semana. Ofereceu-se para me ajudar, contra a minha vontade. Valendo-se de sua autoridade, tomou a iniciativa. Pegou do serrote e pôs-se a serrar os cantos da tábua, no lugar das caçapas. Meu pai operou com uma lógica simples: se um buraquinho pequeno, que mal dá para passar uma bolinha, dá um ´x´ de prazer a uma criança, um buraco dez vezes maior dará à criança dez vezes mais prazer. E assim pôs-se a serrar buracos enormes nos ângulos da tábua. Eu protestava, desesperado: ´ - Pai, não faz isso não!´ Inutilmente. Confiante no seu saber ele levou a sua lógica até as últimas conseqüências. Fez o sinuquinha. Só que nunca joguei uma única partida com os meus amigos. Por uma simples razão: quem começava o jogo encaçapava todas as bolinhas. Com buracos daquele tamanho, não tinha graça. Era fácil demais. A facilidade destruiu a alegria do brinquedo. A alegria de um brinquedo está, precisamente, na sua dificuldade, isto é, no desafio que ele apresenta.
Deliciei-me com uma estória do Pato Donald. O professor Pardal, cientista, resolveu dar como presente de aniversário ao Huguinho, Zezinho e Luizinho, brinquedos perfeitos. Fabricou uma pipa que voava sempre, mesmo sem vento. Um pião que rodava sempre, mesmo que fosse lançado do jeito errado. E um taco de beisebol que sempre acertava na bola, mesmo que o jogador não estivesse olhando para ela. Mas a alegria foi de curta duração. Que graça há em se empinar uma pipa, se não existe a luta com o vento? Que graça há em fazer rodar um pião se qualquer pessoa, mesmo uma que nunca tenha visto um pião, o faz rodar? Que graça há em ter um taco que joga sozinho? Os brinquedos perfeitos foram logo para o monte lixo e os meninos voltaram aos desafios e alegrias dos brinquedos antigos. Todo brinquedo bom apresenta um desafio. A gente olha para ele e ele nos convida para medir forças. Aconteceu comigo, faz pouco tempo: abri uma gaveta e um pião que estava lá, largado, fazia tempo, me desafiou: ´ - Veja se você pode comigo!´ Foi o início de um longo processo de medição de forças, no qual fui derrotado muitas vezes. É preciso que haja a possibilidade de ser derrotado pelo brinquedo para que haja desafio e alegria. A alegria vem quando a gente ganha. No brinquedo a gente exercita o que Nietzsche denominou ´vontade de poder´.
Brinquedo é qualquer desafio que a gente aceita pelo simples prazer do desafio - sem nenhuma utilidade. São muitos os desafios. Alguns são desafios que têm a ver com a habilidade e a força física: salto com vara, encaçapar a bola de sinuca; enfiar o pino do bilboquê no buraco da bola de madeira. Outros têm a ver com nossa capacidade para resolver problemas lógicos, como o xadrez, a dama, a quina. Já os quebra-cabeças são desafios à nossa paciência e à nossa capacidade de reconhecer padrões.
É brincando que a gente se educa e aprende. Cada professor deve ser um ´magister ludi´¸ como no livro do Hermann Hesse. Alguns, ao ouvir isso, me acusam de querer tornar a educação uma coisa fácil. Essas são pessoas que nunca brincaram e não sabem o que é o brinquedo. Quem brinca sabe que a alegria se encontra precisamente no desafio e na dificuldade. Letras, palavras, números, formas, bichos, plantas, objetos (ah! o fascínio dos objetos!), estrelas, rios, mares, máquinas, ferramentas, comidas, músicas - todos são desafios que olham para nós e nos dizem: ´Veja se você pode comigo!´ Professor bom não é aquele que dá uma aula perfeita, explicando a matéria. Professor bom é aquele que transforma a matéria em brinquedo e seduz o aluno a brincar. Depois de seduzido o aluno, não há quem o segure.

quinta-feira, 5 de maio de 2016

OS EFEITOS DEVASTADORES DA PASSAGEM DA TOCHA OLÍMPICA




Como aquele famoso truque que usam os assaltantes baratos nos ônibus e nos demais tumultos humanos de dar um toque forte no ombro para que a pessoa não sinta a mão leve dentro do seu bolso para levar a sua carteira, assim é a passagem da tocha olímpica pelo Brasil. Ridículo o povo brasileiro - que mais parece um secto de caipiras - correndo atrás da tocha, morrendo de emoção e com o coração saindo pela boca. Que emoção é esta? Que besteira é esta? Ainda se fosse lá na roça, quando eu nasci, no início do século passado ainda daria para entender. Mas hoje? Na capital do país? Ah! Seria cômico se não fosse trágico.
Vivemos no Brasil um momento absolutamente ímpar, de crises gravíssimas, de problemas éticos, morais, políticos e econômicos sem precedentes e o povo correndo, cheio de emoção atrás de um foguinho sem graça. O fogo sagrado kkkkk - segundo o palhaço do Galvão Bueno, claro, na TV Globo - um especialista em enganar o povo, sendo, para isto regiamente pago, evidentemente, com o nosso dinheiro, com o qual pagamos pesados impostos que, em última análise, vão para as grandes empresas privadas.
Frente a esta lavagem cerebral que santifica os jogos, a competição exaustivas, os gastos infindos, a vitória a qualquer custo, o povo suspira de emoção atrás da tocha "sagrada" (sagrada sim, pois ilumina o caminho do esporte competitivo que reproduz a operacionalização do poder, da renda centralizada, da vitória de poucos encima da derrota de muitos, o que é maravilhoso para a manutenção da ideologia e do status burguês, dos ricos, dos governantes, dos que nos comandam, e assim, sempre).
Emoção mesmo seria a redução dos juros, o aumento dos salários, da comida, do emprego, da educação de qualidade, da infra-estrutura social para que a cidadania seja real e a qualidade de vida melhore no real concreto das pessoas. Mas, pelo contrário, a alegria e a emoção da passagem da - sagrada - tocha olímpica, é, justamente, para escamotear, enganar e blefar sobre a ausência de tudo isto.
É revoltante ver que ainda hoje a sociedade brasileira - e, inclusive, a sua fatia considerada mais nobre, preparada intelectualmente, inclusive, ainda viva sob os auspícios do pão e circo.Correndo atrás de um foguinho tão ridículo quanto a sua vida política e social e ainda suspirando e morrendo de emoção por causa disso. Ridículo mesmo. Muito mais do que isto.
Brasília viveu um dia de caos com a chegada da tocha: mudança no trânsito, bloqueio de estacionamentos, muita gente na rua, organizações, comércio e serviço público funcionando pela metade. Enfim, tudo para somar aos pesados problemas que, com ou sem tocha nós já temos e vivemos.
Precisamos crescer, evoluir, construir, enfim, uma nova história. Sugiro aqui a leitura do texto: A criança que pratica esporte respeita as regras do jogo ... capitalista, de Walter Bract. Vc vai encontrá-lo no blog:www.mudandoparadigmas.blogspot.com. Veja lá. talvez a sua ficha comece a cair.