segunda-feira, 5 de fevereiro de 2007

"...MAIS UMA VEZ A EDUCAÇÃO"


Para nós educadores é muito comum defrontarmos com um problema que vem de encontro a uma séria discussão feita atualmente pelos grandes pensadores do tema em todo o mundo. Trata-se do que as escolas têm feito para motivarem seus alunos, que, de uma maneira geral, não se predispõem a gostar delas, a freqüentá-las e a realizar as ações relativas às funções e às tarefas dos estudos. Em síntese, a grande maioria dos alunos não gosta de estudar, de ir a escola, pelo contrário, sente um prazer incontido em depredá-la, pichá-la, destruí-la, e, se pudesse, abandona-la-ia imediatamente, e para sempre.
Os alunos só gostam mesmo é de falar em férias, recessos, gereves de professores, então, é um dos temas preferidos, folgas e feriados. Numa pesquisa feita para uma dissertação de Mestrado a pesquisadora detectou que a frase que os alunos mais gostam de ouvir, sendo motivo de ovação, aplausos e gritos de alegria é a seguinte: “... Amanhã não haverá aula...” Ora, alguma coisa está profundamente errada com a educação, seus processos e atividades.
Recorro aqui ao clássico discurso da escola como aparelho ideológico do Estado opressor, o que, infelizmente, grande parte da categoria dos educadores não quer entender, resistindo bravamente a todo processo de uma mudança completa, necessária e inadiável.

Quando você vai por exemplo, a um restaurante e o prato escolhido está muito salgado ou cru e deveria estar bem assado, a culpa não é sua, enquanto cliente; mas de quem o fez, dos cozinheiros, chefes, enfim, da equipe responsável pelas tarefas culinárias. O mesmo acontece com a escola: os profissionais que nela atuam é que são os diretamente responsáveis por seus processos e resultados. Eles é que precisam descobrir fórmulas de motivar os alunos, de integrá-los à ação da escola, avivar a vontade, o interesse, o prazer de estudar e de estar e permanecer nela.
Ainda hoje, ao contrário do que pensa fazer, boa parte dos educadores, sobretudo os mais convencionais e ortodoxos, estão a serviço de uma ação contra o ser humano e a favor do capital; contra o aluno e a favor da estrutura econômica; contra a vida e a serviço do poder, da dor, do sofrimento das pessoas e das agruras do mundo, atendendo a um poder terrível e monstruoso: um crime silencioso contra a felicidade das pessoas. Os educadores fazem de tudo para ensinarem o que os alunos não precisam, mas ao contrário, o que odeiam e rejeitam porque não serve a eles, mas para adequá-los aos interesses das empresas, do poder, da economia internacional, da destruição da paz e da vida.
E eles, por sua vez, ao se verem preteridos de possíveis conhecimentos e aprendizados que figurem entre os que vão ajudá-los a viver melhor, se rebelam contra a escola, o que, segundo Rubem Alves pode significar um processo psicológico de defesa, o que ele considera como um fator humano absolutamente natural, quando diz: “Por vezes a maior prova de inteligência se encontra na recusa em aprender. É que o corpo tem razões que a didática ignora. É preciso discernir o que é bom para a vida daquilo que só é bom para o lucro”. Não posso aqui deixar de concordar com R. Alves, até porque tem sido este o meu discurso ao longo dos anos.
Entendo que o fracasso da educação e da escola, a resistência dos alunos, a reprovação, o vandalismo, o desinteresse, enfim, a crise educacional é responsabilidade exclusiva dos professores , dos gestores da escola das autoridades educacionais em todos os níveis. E o pior, os educadores ingênuos não sabem e não querem saber disso. O que faz parte do jogo doentio do poder.
Quase nada do que a escola ensina tem o menor interesse para a vida, o cotidiano, as descobertas, a felicidade, o prazer, a alegria, a concretização dos sonhos. Mas ao contrário, serve para adequar o aluno a um mundo de exploração e sofrimento, sem que ele se dê conta disso. Enfim, a educação é uma espécie de antídoto amortecedor dos rigores da dominação. E o faz por meio de instrumentos adestradores, aniquiladores da vontade, do prazer, do desejo. Em síntese, a escola acaba se transformando numa arena de sofrimento, negação, desprazer e obrigações, não proporcionando interesses ou motivações outras. Estar na escola é um martírio para muitos, principalmente para os mais inteligentes, perspicazes, críticos, inquietos - que enxergam nas entrelinhas, não são bobinhos incautos à pura maldade institucional da escola - que são justamente aqueles mais propícios ao vandalismo, ao quebra-quebra, ao questionamento, à algazarra, à farra pois precisam extravasar a sua energia acumulada.
Precisamos repensar a escola com muita profundidade e fazê-lo a partir de sua dinâmica interna, ou seja, da cabeça de quem a faz funcionar. Os educadores devem dominar um novo e revolucionário conceito do que seja a educação e suas práticas. Resolver suas questões de auto-estima, de afetividade, de visão das coisas e do mundo...coitados! Enxergar criticamente o papel da educação, da escola e seus condicionantes políticos e psicológicos em relação à evolução histórica do mundo e da vida, percebendo os serviços e desserviços que prestam à sociedade.
À revelia dos avanços tecnológicos, dos ciclos econômicos e produtivos, a escola é uma das instituições mais conservadoras, antigas, tradicionais e estagnadas. Ela continua na idade da pedra, literalmente – os professores para ensinar ainda escrevem na pedra – por mais incrível que possa parecer. Funciona da mesma maneira às gerações a fio, com o professor de pé em frente, cuspindo poder e condicionando os alunos a recebê-lo e aplicá-lo da forma que foi imposta e a qualquer custo, pois assim teremos cidadãos subservientes, trabalhadores submissos, consumidores em potencial, perpetuando a exploração, a miséria, a fome de muitos, em troca do poder, do bem-estar e da riqueza de poucos.
Portanto, a tão sonhada melhoria da qualidade de vida que tanto esperamos, o fim da crise que assola o planeta, da degradação da natureza, da violência urbana, por exemplo, dependem muito do papel, da coragem e da ousadia das autoridades educacionais, dos gestores da escola, em última instância, dos educadores em geral, cabendo a cada um o começo deste processo, repensando e refazendo a sua parte, as suas práticas. Talvez fosse bom recomeçar pelo amor, a autocrítica. Recomeçar pela verdade e a vida, a natureza, o planeta agradecerão com um sorriso de esperança, alegre e franco nos lábios.