domingo, 9 de dezembro de 2012

PEDAGOGIA DA FELICIDADE: A SAÍDA POSSÍVEL


 (*) Antonio da Costa Neto


“... por vezes, a maior prova de inteligência está na recusa em aprender. É que o corpo tem razões que a didática ignora. Precisamos decifrar o que é bom para a vida do que só é bom para o lucro...”
(Rubem Alves) 

          Para nós, educadores, é comum defrontarmos com um dilema que vem de encontro à séria discussão feita na área em todo o mundo: O que as escolas têm feito para os alunos não gostarem delas? A maioria dos alunos não quer ir à escola. Pelo contrário, sente um prazer incontido em depredá-la, pichá-la, destruí-la. E, se pudesse, a abandonaria para sempre. Eles querem falar em férias, recessos, feriados e que a greve dos professores chegue e perdure por longos meses e coisas afins.
        Numa pesquisa feita por uma respeitada organização de ensino de São Paulo detectou-se que a frase que os alunos mais gostam de ouvir é a seguinte: “... Amanhã não haverá aula!...” Ora, alguma coisa está errada com a escola e seus processos. É que estamos muito longe de saber e de fazer a verdadeira educação.
        E o instinto de sobrevivência dos alunos já os protege dos seus mecanismos prejudiciais, se considerarmos o que seria aprender para ser agente de um mundo com um mínimo de prazer e paz. Mas, e os pedagogos, os professores, os profissionais de educação? Ora, estes são os que desconhecem por completo o que seria educar de fato, por mais incrível que possa parecer. É que, infelizmente, foram obcecados por uma certa ordem pedagógica que não educa, mas adestra, confina em nome da “pseudo-educação” que fazem por meio dos conhecimentos que julgam ensinar. Assim, adequam as maiorias, os alunos, aos interesses das minorias privilegiadas. Operam o horror contra a humanidade e nem sabem disto.
      A cegueira conceitual a que são expostos - especialmente durante a sua formação profissional - os inibe de enxergar a realidade que decorre de suas ações. Recorro aqui ao discurso da escola como aparelho ideológico do Estado opressor. O que parte dos educadores não quer entender. Resistindo bravamente.
      Ainda hoje, os educadores, sobretudo os mais convencionais estão contra o aluno e a favor da estrutura econômica, do poder e das agruras do mundo. E fazem tudo para ensinar o que os alunos não precisam e rejeitam porque não serve a eles, mas para adequá-los aos interesses de uma sociedade perversa. Do que se defendem, como nos lembra Rubem Alves: “... por vezes, a maior prova de inteligência está na recusa em aprender. É que o corpo tem razões que a didática ignora. Precisamos decifrar o que é bom para a vida do que só é bom para o lucro...” Que, quase sempre, prejudica e destrói a vida.
        O grande problema, talvez o único, é que os educadores se esquecem de que vivemos num mundo dual, de dominantes e dominados e foram treinados para beneficiar os comandos, sucumbindo os demais à exploração fácil. A escola inculca uma moral escrava, facilitando a formação de seres potencialmente exploráveis, que, por sua vez, se rebelam, se ausentam, conflituam. O que é um processo psicológico de defesa absolutamente natural.
       Assim, havemos de concordar com os que travam a luta ideológica contra as lides da escola que aí está e que tem sido um brutal processo contra todas as pessoas, de uma ou de outra formas. À medida em que, por exemplo, facilitam a concentrador de poder e de requeza no âmbito dos critérios econômios, ela instaura, naturalmente, a pressão, a violência, o perigo e o risco contra todos. Pois é impossível enriquecer os ricos sem empobrecer, explorar e violentar o pobre, o que cria, a nosso ver, um ciclo vicioso de violêcias contra todos e, assim, por diante. 
       O fracasso da educação, a resistência dos alunos, a reprovação, o vandalismo, enfim, a crise educacional é responsabilidade exclusiva dos educadores em todos os níveis. Não é o aluno que é preguiçoso, indolente. É a escola que é cética, dura, rígida, desinteressante e se perdeu nos caminhos da história. E continua aí sem coragem para enfrentar os desafios necessários de reconduzir o teor do poder, da crítica, da distribuição da riqueza. O que o sistema macro se nega a fazer não economizando esforços para tal.
      Com o que constrói o caos, ao qual sucumbe a cada momento. E, para superar isto, é preciso que os educadores se debrucem sobre este conjunto de causas e passem a entender a dimensão política e social do que fazem e como fazem.
     Para melhorarmos a educação e a escola, são os seus profissionais é que precisam primeiro, melhorar, mudar, e, não, os seus frequentadores. É ela que tem que se adaptar aos interesses dos alunos e não o contrário. É este o jogo político a ser reformulado.
          Muito pouco do que a escola faz tem o menor interesse para a vida a felicidade. Ela ensina o que serve aos interesses das elites. E o faz por meio de instrumentos aniquiladores de toda consciência, no que se transforma numa arena de sofrimento. Não proporcionando motivações outras, como se o aprender na escola fosse o mesmo caminho do gado que parte silencioso para o matadouro. E molda um futuro despido de esperanças.
     Por isso, estar na escola é um sacrifício para muitos. Principalmente, para os mais inteligentes e perspicazes. Precisamos refazer a educação com muita profundidade, e, a partir de sua dinâmica interna, ou seja, da cabeça de quem a faz. Os educadores devem dominar um novo conceito e enxergar criticamente o papel da educação e relativo à história do mundo, percebendo os serviços e desserviços que prestam, os infinitos erros que cometem, enfim, a ingenuidade política que lhes é imposta e contra a qual não conseguem revidar. 
        Vivemos hoje num mundo que é fruto da fina inteligência e não pode mais se submeter à ignorância com que as escolas têm atuado. E quando digo escolas, digo todas: a pública e a particular, elas existem para legitimar a exploração humana; pioram as pessoas, trocando seus sentimentos por cifras, coragem, por medos, bondades, por ganância desenfreada. Todas elas fazem isto. Com maior ou menor rigor, elegância e sofisticadas “técnicas pedagógicas” num desserviço sem precedentes às sociedades a que julgam servir. À revelia dos avanços humanos a escola é uma das instituições mais conservadoras e tradicionais e continua na idade da pedra – os professores para ensinar ainda escrevem na pedra .      Funciona da mesma maneira à gerações incontáveis, com o professor de pé, na frente, cuspindo poder, o que começa com a sua postura e o cenário das ultrapassadas salas de aula, onde um comanda, todos obedecem a exemplo dos estados totalitários e ninguém se dá conta disto: as instituições, as universidades, os sindicatos de classes. 
   Condicionam os alunos a receberem o conhecimento passivamente, pois, assim, teremos cidadãos subservientes, trabalhadores submissos, perpetuando a exploração fácil, o que constitui a alienação mais refinada perversa e criminosa. Portanto, o mundo novo com que tanto sonhamos, depende também dos educadores em geral e dos professores em particular, pois eles formam as consciências dos que conduzem a vida. Cabe, portanto, a cada um o iniciar deste processo sem os discursos defensivos e inúteis. Recomeçar pelo amor às crianças, aos jovens, aos, aprendizes: “estes seres estranhos que não entendem a nossa linguagem”.
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(*) MsC em Políticas e Administração da Educação. Professor, pesquisador, conferencista. Desenvolve projetos de qualificação humana e pesquisas sobre o tema. É autor de livros, artigos e inúmeras publicações e presta consultorias na área.