quinta-feira, 28 de junho de 2007

NÓS, OS EXCLUDENTES


"...Suponhamos que comecemos fazendo uma lista dos problemas do mundo de hoje que, em princípio, podem ser resolvidos com a moderna tecnologia.
Em princípio, temos a capacidade tecnológica para alimentar, abrigar, proteger, dar carinho, afeto, calor humano e vestir adequadamente todos os habitantes do mundo.
Em princípio, temos a capacidade tecnológica para proporcionar suficiente cuidado médico, assegurando uma saúde de alta qualidade para todos os habitantes do mundo.
Em princípio, temos a capacidade tecnológica, humana e pedagógica para oferecer suficiente educação a todos os habitantes do mundo para gozarem de uma vida intelectual e cultural madura.
Em princípio, temos a capacidade tecnológica de colocar fora da lei a guerra e instituir sanções sociais que evitarão o conflito ilegal e o derramamento de sangue de milhares de inocentes.
Em princípio, temos a capacidade de criar em todas as sociedades uma liberdade de opinião, pensamento e atitude que reduzirá ao mínimo os constrangimentos ilegítimos impostos pela sociedade ao indivíduo.
Em princípio, temos a capacidade de desenvolver inúmeras tecnologias que libertarão novas fontes de energia natural e poder para o pleno atendimento das emergências físicas, sociais, políticas, éticas, culturais, psicológicas e ecológicas em todo o mundo.
Em princípio, temos a capacidade de organizar as sociedades do mundo atual para realizarem planos de saúde, educação, liberdade humana, produção de alimentos, habitação, infra-estrutura desenvolvida a fim de resolver todos os problemas da pobreza, da miséria, fome, violência, mortalidade infantil, degradação da natureza, educação e o desenvolvimento de novos recursos necessários para assegurar uma boa qualidade de vida para todos os habitantes do mundo, indistintamente.
Claro, todos sabemos que o ser humano é capaz de fazer todas estas coisas. Por que então não as faz? Haverá um perverso traço de caráter que corre através da espécie humana e que torna um ser humano indiferente à condição do outro? Ou estamos essencialmente em face de um tipo de degradação moral que nos permite ignorar nosso vizinho em razão do nosso próprio interesse?
Existirá uma razão mais profunda e sutil pela qual, a despeito de nossa imensa capacidade tecnológica, não estamos ainda em condições de resolver os principais problemas do mundo? Se passarmos os olhos pela lista dos problemas, há um aspecto deles que logo se sobrepõe parcialmente. E claro que a solução de um problema tem muito haver com a solução de outro, que, por sua vez, tem muito haver com a solução de todos.
São tão interligados e imbricados de fato, que não é de modo algum claro por onde devemos começar. Suponhamos, por exemplo, que concebamos a idéia de que o primeiro problema a ser solucionado é o de alimentar, abrigar, assistir e vestir adequadamente todos os habitantes do mundo. Como começaríamos a resolver este problema? A capacidade tecnológica existe, a capacidade profissional, também. Podemos produzir todo o alimento necessário para se chegar a este resultado, os materiais de construção que ofereceriam o abrigo, os tecidos que vestiriam cada indivíduo e a assistência afetiva, moral e psicológica para cada um deles. Então, por que não fazemos isso?
A resposta é que não estamos organizados para fazê-lo.
Não fomos educados para fazê-lo.
A nossas exacerbadas competição e alienação política, a falta de amor e compaixão não nos deixa fazê-lo.
Enfim, não queremos fazê-lo.

(C. West. Churchman)

NECESSIDADE DE MUDANÇA



Por que as coisas estão separadas? Por que as vemos assim? Veja esta paisagem por exemplo. Se não houvesse a luz do Sol, se não houvesse essa magnifica iluminação, essa árvore não estaria aí e esta não seria uma bela paisagem. Se o não houvesse a grama ou as nuvens, não seria esta mesma paisagem equilibrada. Bati esta foto com o celular enquanto caminhava por um bosque que tem aqui perto de casa. Não é nenhum lugar cinematográfico mas é um lugar que me deu paz.
A natureza é a coisa mais bela que existe pra mim, no entanto, hoje vivo uma angustia por não ver as coisas integradas, por fazer divisões e separações na minha vida. Tenho me questionado, por que não sou como a natureza?

É justamente aí que mora a questão dos paradigmas que desejamos tanto mudar. Estamos vindo de uma história de muitos séculos - na verdade, milênios - em que nos habituamos a ver, sentir e fazer as coisas de forma separada, fragmentada, mecânica. Nada tem haver com nada. As partes e o todo são tratados isoladamente, como funções distintas e segmentos estanques, isolados e antagônicos. É o que vai infernizando o mundo e a vida.

Portanto, experimente o novo, a considerar aos coisas, os fenômenos e as pessoas como unos, interligados. Pratique o efeito dominó em sua vida. Analise os fatos e fenômenos como um sistema de partes interligadas, imbricadas, unidas; de forma que não se perceba nitidamente a separação umas das outras. Esqueça que umas pesssoas são da sua família e outras, não. São ou não suas amigas, brancas, pretas, cor-de-rosas ou amarelas; conhecidas, desconhecidas, estrangeiras... Experimente a sofrer porque na casa de alguém não tem o que comer e comece a dividir o que é seu, que na verdade é de todos, é nosso. Pratique a compaixão em todos o momentos e pense se aquilo que você está fazendo naquele momento, de fato, ajuda a melhorar o mundo.

Questione tudo. Pense. Talvez não precisamos nos descartar de tudo. Mas, certamente, vivemos um momento onde temos que, necessariamente, questionar tudo. Dedique sua vida, seu tempo, seu sorriso e suas mãos para que o mundo seja melhor. E ele será melhor para todos. E você dormirá em paz todas as noites. O que é mais do que suficiente para começar. Comece ontem.


(Antonio da Costa Neto).

FRASES ENCANTADORAS DE GABRIEL GARCIA MARQUEZ


" Descobri que não sou disciplinado por virtude, e sim como reação contra a minha negligência; que pareço generoso para encobrir minha mesquinhez, que me faço passar por prudente quando na verdade sou desconfiado e sempre penso o pior. Que sou conciliador para não sucumbir às minhas cóleras reprimidas, que só sou pontual para que ninguém saiba como pouco me impora o tempo alheio. Descobri, enfim, que o amor não é um estado da alma, e, sim, um signo do zodíaco."


"O mundo era tão recente que as coisas careciam de nomes. E para nominá-las havia que se apontá-las com os dedos."


"Dê me um preconceito e eu moverei o mundo."


"A sabedoria só nos chega quando não serve mais para nada."


"Nenhuma pessoa merece tuas lagrimas. E quem as merece jamais te fará chorar."


"Não há remédio que cure o que a felicidade não cura."


"Um homem só tem o direito de olhar o outro de cima para baixo se for ajudá-lo a levantar."


"É necessário abrir os olhos e perceber que as coisas boas estão dentro de nós."


"É preciso muitos anos de sofrimento e miséria para se conquistar os privilégios da solidão."


"O coração tem mais quartos do que uma pensão de putas."


(Gabriel Garcia Marquez)

quarta-feira, 27 de junho de 2007

MEU TIO ZÉ DO MATÃO

Tio Zé Magno morava no Matão com Tia Lica.
Matão que depois virou Ouro Verde, por causa do café.
Com suas ruas tortuosas, suas casas velhas
decoradas com pedras, imbés, árvores imensas.
Muitos coqueiros e pés de figo para os doces de
Dona Deocleciana, com aquele narigão e a cara
vermelha, debaixo da pituca bem comportada.
A casa de Tio Zé Magno também era bonita e grande.
Ele era carpinteiro, como o santo.
Acho que foi por causa do nome.
Pena que Tia Lica não servia para ser Nossa Senhora,
era feia, velha, dizia-se cega e gostava
de fazer umas ruindades. Pequenas, mas ruindades.
Ela também não tinha filhos.
Contava que deu à luz as gêmeas: Cordai e Magali,
mas que as duas morreram ao nascer.
Dizia que o parto foi feito às pressas, com garfo
e faca de mesa.
E eu que não sabia o que era parto, pensava
que o médico queria comer as crianças e
ficava matutando nisso antes de dormir.
No quintal, a oficina cheia de serragem e pedaços de madeira.
Os pés de beladona muito carregados com aquela flor imensa
que parecia as mulheres que a gente vê nos livros de história
com as saias longas e cheias de babados coloridos.
Eu ficava olhando aquilo e inventando coisas.
De noite, com frio, as mulheres colocavam seus xales
e todos iam conversar na sala.
Minha vó falava das receitas e da doença de D. Rita,
sua vizinha.
Meu Tio Zezinho – irmão caçula do meu pai
mostrava com orgulho os primeiros fios do bigode. Coitado...
Tia Lica aproveitava para exibir seu tesouro: uma coleção
com muitas toalhas de mesa de plástico, coloridas.
Tinha uma de crianças holandesas colhendo tulipas,
um verdadeiro espetáculo.
Uma de frutas, a coisa mais linda!
Outras de colunas gregas, patos, peixes, flores, passarinhos...
Uma infinidade...
Depois ela dobrava uma a uma com todo cuidado, toda orgulhosa.
Minha tia Luiza se propunha a ajudar, mas ela agradecia
e afastava a sua mão para que ninguém as tocasse.
Tio Zé Magno raspava a garganta e ia para a cozinha,

passava um café
daqueles torrados em casa e o cheiro rescendia
pela vizinhança.
Um cheiro de café de quem não tem pecado.
Tia Lica era meio manca e muito lenta.
Arrastava vagarosamente os pesados chinelos
pelo quintal e pela casa,
passando as mãos no cabelo e reclamando
das dificuldades da vida.
Mas para ela – que se fazia de cega
para não fazer nada – era até muito fácil.
Tio Zé Magno cheio de paciência
entregava nas suas mãos o pente, as meias,
o prato de comida que ele mesmo fazia
e a xícara grandona de café que ela
sorvia gole a gole, sentindo bem o gosto

com os olhos fechados.
E, de vez em quando, batia com força o fundo da
xícara pesada na mesa,
como se fosse uma governadora.
Ele cheirava rapé e dizia que era dos bons.
Fez-me um carrinho de madeira que era uma beleza,
com uns belesqüetes encima que rodavam, rodavam,
rodavam juntos e no mesmo ritmo.
E eu os pintei de várias cores com tinta de urucum,
de açafrão e corantes de papel de seda.
Ficou maravilhoso e eu brincava com aquilo o dia inteiro.
Era o que bastava para o meu coração ficar
derramando de felicidade.
Tio Zé Magno deve ter virado Santo.
Pois além de agüentar as cavalices de Tia Lica
ele me deu de presente a maior alegria do mundo

e dar alegria pra criança é o princípio básico
para a santificação...
...Eu gostei da toalha das crianças holandesas
e pedi à minha Tia para deixá-la na mesa.
Ela titubeou, mas me atendeu com um sorrisinho desconfiado.
Foi a única boa ação de Tia Lica que já se teve notícia.


(Antonio da Costa Neto)

domingo, 17 de junho de 2007

NADA MAIS QUE O AMOR...


"Os que têm


coração forte


não precisam


de nada


mais além


do


amor."




(Marilyn Ferguson)

sexta-feira, 8 de junho de 2007

POEMA DO MENINO JESUS
















Num meio-dia de fim de primavera
Eu tive um sonho como uma fotografia
Eu vi Jesus Cristo voltar à terra
Veio pela encosta de um monte.
E era a eterna criança, o Deus que faltava.
Tornando-se outra vez menino,
A correr e a rolar pela relva
E a arrancar flores para deitar fora
E a rir de modo a ouvir-se de longe.
Tinha fugido do céu.
Era nosso demais para fingir de
segunda pessoa da Trindade.
Um dia, que Deus estava dormindo
e que o Espírito Santo andava a voar
Ele foi até a caixa dos milagres e roubou três.
Com o primeiro, ele fez com que ninguém
soubesse que ele tinha fugido.
Com o segundo, ele criou-se eternamente
humano e menino.
E com o terceiro ele criou um Cristo e o
deixou pregado numa cruz que serve de modelo às outras.
Depois ele fugiu para o sol
e desceu pelo primeiro raio que apanhou.
Hoje ele vive comigo na minha aldeia
e mora na minha casa em meio ao outeiro.
É uma criança bonita, de riso e natural.
Atira pedra aos burros.
Rouba a fruta dos pomares.
E foge a chorar e a gritar com os cães.
Nem sequer o deixaram ter pai e mãe
como as outras crianças.
Seu pai eram duas pessoas: um velho carpinteiro
e uma pomba estúpida, a única pomba feia do mundo.
E sua mãe não tinha amado antes de o ter.
Não era mulher, era uma mala em que ele tinha vindo do céu.
E queriam que justamente ele pregasse o amor e a justiça.
Ele é apenas humano, limpa o nariz com o braço direito,
chapina as possas d'água; colhe as flores, gosta delas, esquece-as.
E porque sabe que elas não gostam e que toda a gente acha graça,
ele corre atrás das raparigas que carregam as bilhas na cabeça
e levanta-lhes as sáias.
A mim, ele me ensinou tudo.
Ensinou-me a olhar para as coisas.
E aponta-me todas as coisas que há nas flores.
Mostra-me como as pedras são engraçadas
quando a gente as tem nas mãos e olha devagar para elas.
Ensinou-me a gostar dos reis e dos que não são reis.
E tem pena de ouvir falar das guerras e dos comércios.
Diz-me muito mal de Deus.
Diz que ele é um velho estúpido e doente.
Sempre a escarrar no chão e a dizer indecências.
A Virgem Maria leva as tardes da eternidade a fazer meias.
E o Espírito Santo coça-se com o bico;
empoleira nas cadeiras e suja-as.
Tudo no céu é tão estúpido como nas Igrejas.
Diz-me que Deus não percebe nada das coisas que criou,
do que duvido.
"Ele diz por exemplo que os seres
cantam sua glória."
Mas os seres não cantam nada, se cantassem, seriam cantores.
Eles apenas existem e por isso são seres.
Ele é o humano que é o natural.
Ele é o divino que sorri e que brinca.
E é por isso que eu sei com toda certeza
que ele é o Menino Jesus verdadeiro.
E depois, cansado de dizer mal de Deus
ele adormece nos meus braços
E eu o levo ao colo para casa.
Damo-nos tão bem um com o outro
na companhia de tudo
que nunca pensamos um no outro
Mas vivemos juntos os dois
com um acordo íntimo,
como a mã0 direita e a esquerda.
Ao anoitecer, nós brincamos nas
cinco pedrinhas no degrau das portas de casa.
Graves, como convêm a um deus e a um poeta.
E como se cada pedra fosse um universo
E fosse por isso um grande perigo
deixá-la cair no chão.
Depois ele adormece
E eu o deito na minha cama
despindo-o lentamente
seguindo um ritual muito limpo, humano e materno
até ele ficar nu.
Ele dorme dentro da minha alma.
Às vezes ele acorda de noite
E brinca com os meus sonhos
Vira uns de perna para o ar,
Põe uns encima dos outros
E bate palmas sozinho sorrindo para o meu sono.
Quando eu morrer, filhinho,
Seja eu a criança, o mais pequeno.
Pega-me tu ao colo
E leva-me para dentro da tua casa
E deita-me na tua cama
E conta-me histórias, caso eu acorde,
para eu tornar a adormecer.
E dá-me os sonhos teus para eu brincar.
(Alberto Caeiro)

quinta-feira, 7 de junho de 2007

MINHA MAGESTADE, CANÔ...

Dentre uma das minhas muitas visitas a Salvador, tive um estalo repentino: queria visitar D. Canô Veloso, em Santo Amaro da Purificação, no recôncavo, há alguns quilômetros da capital baiana. Levantei-me cedo e fui ressabiado para a Rodoviária, pensando no grande papel de bobo que poderia estar fazendo.
Menos de uma hora depois, estava eu em Santo Amaro, dando voltas pela cidade, sem a coragem de bater na porta do imenso casarão branco, imponente e posudo com detalhes em madeira azul, telhado colonial, na Av. Viana Sena, nº 328, no centro da pacata e encantadora Santo Amaro da Purificação - Bahia.
Andei pela cidade, fiz algumas fotos e, ainda inseguro, perguntei por uns meninos que jogavam bola alí perto da casa, se eles conheciam D. Canô. Foram prontos e rápidos ao entrarem casa a dentro pelos longos corredores, gritando: - "Dona Canô! Dona Canô! Tem um moço aqui querendo falar com a senhora..."
Mantive-me na porta, impávido e gelado. Estava prestes a me encontrar com uma celebridade-santa. Eis que ela surge na porta de onde começa o coredor. Esta fechava em sua cintura e eu só via o seu busto encantador com aquele sorriso de luz. Os cabelos brancos e longos, presos discretamente no alto da cabeça com presilhas brancas e brilhantes, fazendo um tom-sobre-tom que realçava aquela beleza profunda e mais que angelical.
Um sorriso doce emoldurado por grandes olhos castanhos claros, lúcidos, brilhantes e inquietos. Belas e profundas rugas marcavam aquela imagem sagrada. A blusa branca com rendas da mesma cor, sobrepostas, dando sobriedade, elegância e altivez de rainha. Com braços e mãos abertos num gesto caloroso de alegria... Foi quando senti o cheiro forte de leite de rosas. Nada tão emocionante, naquele cenário amplo, simples, limpíssimo, brilhante como as almas e as alegrias oriundas de um santuário verdadeirio, movimentado e dinâmico pela cachorra: Bonita(não poderia haver outro nome melhor).
Simpática e calorosa ela disse que eu não poderia sair dali sem almoçar. Tratou de preparar uma salada, um prato mais que especial, o que muito me honrou. Comemos à mesa aquelas delícias baianas regadas a carne de sol bem temperada, saladas, muito feijão, pimenta, farofa e um suco de maracujá, cujo gosto jamais poderei esquecer.
Depois ela se senta elegantemente, com uma classe siingular. Me conta histórias de sua vida, a luta para a criação dos muitos filhos, o começo da vida artística de Caetano e Bethânia, misturando risos, coisas bucólicas. Mostra-me retratos antigos de todos, som, discos. Vamos para o quintal nos sentar entre roupas no varal, brisa, flores e mangueiras. Ela pergunta de minha vida, da minha história, a qual, muito respeiosamente compara com a dos seus filhos. Me fala de Mabel, Rodigo, Roberto, Caetano, Bethânia, Clara, Irene e Nicinha que, aliás, era a única que estava em casa com a sua exótica e graciosa timidez.
Caminhamos pelas ruas de mãos dadas e visitamos alguns de seus amigos mais íntimos. Todos me olhavam com muita inveja e eu me sentia a mais feliz das criaturas. Aprendi com ela que não devemos ter orgulho de nada, mas alegria pelas coisas que a vida e Deus nos proporcionam.
Fiquei feliz porque conheci a imgem da pureza na figura daquela mulher tão frágil, mas com alma de leoa. Aquele riso doce e mãos milagreiras de uma santa que formata o amor, a harmonia. A verdadeira estrela que ilumina a arte e a múscia. A madona das harmonias e dos rítmos. O grande mito de mãe, de mulher, de devota, carregada de orações e bondades. Dona Canô não tem pecados. Foi batizada no Subaé pelo espírito de João Batista, tornando-se um anjo de encantamento. Um dos poucos exemplares humanos que ainda justificam a existência e a continuidade da vida.
A matriarca dos Veloso teve uma boa formação. Apesar da origem humilde, freqüentou o Colégio das Sacramentinas, escola paga e destinada exclusivamente a moças. Aprendeu o idioma francês e teve aulas de piano. "Naquele tempo não havia ginásio nem nada disso. Mas o ensino era muito superior ao de hoje", ela diz. Dona Claudionor ganhou este apelido por causa de um menino da família que não conseguia pronunciar o seu nome.
O casamento de dona Canô, em 7 de janeiro de 1931, coincidiu com a decadência dos engenhos de açúcar do Recôncavo. Ela foi morar com o marido, José Telles Velloso, um telegrafista da Companhia de Correios e Telégrafos, na casa da sogra, na rua Direita, formando uma família de 28 pessoas. Na época já tinha a responsabilidade de criar uma filha: Nicinha, uma menina de três anos, que elegeu os Veloso a sua segunda família.
A primeira filha biológica do casal, Clara Maria, nasceu um ano depois. Em seguida, vieram Maria Isabel, Rodrigo, Roberto, Caetano e Maria Bethânia. Irene, a caçula, tema de uma música de Caetano, só seria adotada por Canô anos depois. Oito filhos ao todo. "Eu não pensava ter muitos filhos, mas não tinha como se evitar naquele tempo", diz.
Os anos trinta marcaram a chegada dos primeiros automóveis. Foi quando surgiu a marinete, o primeiro ônibus da cidade, levado pelas mãos de um certo João. João da Marinete modernizou o transporte local e anos mais tarde, durante os freqüentes cortes de energia no tempo da guerra, garantiu a transmissão radiofônica da novela O Direito de Nascer. Com o auxílio do gerador de seu coletivo fazia chegar à platéia, reunida na praça, o drama de Mamãe Dolores, Isabel Cristina e Albertinho Limonta.
Quando a Segunda Grande Guerra chegou ao fim, em 1945, os Veloso começaram a detectar os sinais das inclinações artísticas dos filhos. Aos quatro anos, Caetano grafitava as paredes da casa com o carvão tirado do fogão a lenha, até descobrir tintas, paletas e pincéis, com os quais chegou a produzir alguns quadros na adolescência. Com dez, gravou seu primeiro disco. "Caetano ficou na sala com o microfone enquanto Nicinha tocava o piano", lembra Dona Canô. Foram duas faixas: "Mãezinha Querida" e "Feitiço da Vila", de Noel Rosa. "Esse disco está com meu filho Rodrigo até hoje. Durante muitos anos a gravadora correu atrás de Caetano feito doida." Mabel, que mais tarde viria a ser uma poetiza, tornou-se a guardiã dos primeiros escritos de Caetano. Maria Bethânia, embora gostasse de cantar, era barrada no coral do colégio pelo grave timbre que sua voz já revelava. "Mas ela não se importava. Dizia que ia ser artista", conta a mãe.
E no início na década de 60 o casal se transferiu para Salvador, acompanhando os filhos que procuravam trabalho. Veio o show no Teatro Opinião e a partida dos caçulas para o Rio de Janeiro. Bethânia tinha dezessete anos. "Zeca não queria que ela fosse, mas Caetano disse: ela vai comigo". Em seguida, vieram os festivais de música da antiga TV Record e Santo Amaro saltou do mapa aos olhos do País.
Os anos de chumbo projetaram os Veloso em profunda angústia e sofrimento. Caetano partiu, em 1969, para o exílio em Londres junto com o parceiro Gilberto Gil, depois de ficarem presos alguns meses no Rio. "Foi uma coisa bárbara. Queriam incriminá-lo com acusações falsas", lembra a mãe. Foram dois anos e meio de ausência, quebrada apenas durante alguns dias por ocasião dos 40 anos de casamento de Zeca e Canô. Isso por determinação de Maria Bethânia, que foi ao presidente Garrastazu Médici pedir a concessão de uma visita.
Em 1984, o casal voltou ao antigo casarão de Santo Amaro da Purificação, de acordo com o desejo do marido. Doente, Zeca queria morrer em sua terra, o que aconteceu apenas seis dias depois da mudança. Desde então, dona Canô só deixou a cidade em visitas aos filhos ou para acompanhá-los em viagens. Conheceu Paris, Nova York, Madri, Barcelona, mas é de Roma que ela guarda a melhor lembrança: a platéia toda de um concerto de Caetano com isqueiros acesos na mão, aclamando o cantor. "Ver o teatro todo iluminado foi a coisa mais linda", diz. Hoje, aos 96 anos, oito filhos e nove netos, dona Canô procura restringir seus compromissos sociais. Mantém agendadas só as primeiras terças e sextas-feiras de cada mês, além dos domingos, quando vai religiosamente às missas na Igreja da Nossa Senhora da Purificação. Mesmo aos shows dos filhos, prefere ir apenas em ocasiões excepcionais, como no concerto do tenor Luciano Pavarotti ao lado de Gal Costa e Maria Bethânia, em Salvador. "Aqui é o meu canto", diz.
Sempre com o risco de quebra da locomotiva, alimentada a lenha. "Mesmo assim eu preferia ir de trem recordando os tempos da minha querida e emocionante motriz", conta dona Canô e ri belamente, eexternando lírios e o mundo de graças, bênçãos e alegrias que transbordam do seu coração iluminado. E num gesto belo e simples encanta-me para sempre como exemplo de um ser humano muito mais do que especial.


Minha paixão.
Minha reverência e respeito.
Meu afeto muito mais que incondicional.
Minha Majestade, Canô!

(Antonio da Costa Neto)

quarta-feira, 6 de junho de 2007

O MAIS IMPORTANTE É A MUDANÇA


Mude.
Mas mas não tão devagar.
Pois a direção é tão importante quanto a velocidade, frente à emergência da mudança ditada pelo atual momento histórico de todo o mundo.
Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa.
Mais tarde, mude de mesa.
Quando sair, procure andar pelo outro lado da rua.
Depois, mude de caminho.
Ande por outras ruas, calmamente, observando com atenção os lugares por onde você passa.
Tome outros ônibus.
Mude por uns tempos o estilo das suas roupas.
Dê os seus sapatos velhos.
Procure andar descalço alguns dias.
Tire uma tarde inteira para passear livremente na praia.
No parque e ouvir o canto dos passarinhos.
Veja o mundo de outras perspectivas.
Abra e feche as gavetas e portas com a mão esquerda. Durma no outro lado da cama...depois, procure dormir em outras camas.
Assista a outros programas de tv, compre outros jornais.
Leia outros livros.
Viva outros romances.
Não faça do hábito um estilo de vida.
Ame a novidade.
Durma mais tarde.
Durma mais cedo.
Aprenda uma palavra nova por dia e, também, uma outra língua.
Corrija a sua postura.
Coma um pouco menos,escolha comidas diferentes.
Novos temperos, novas cores,novas delícias.
Tente o novo todo dia.
O novo lado, o novo método, o novo sabor, o novo jeito, o novo prazer, o novo amor.
A nova vida.
Tente.
Busque novos amigos.
Tente novos amores.
Faça novas relações.
Almoce em outros lugares vá a outros restaurantes.Tome outro tipo de bebida. Compre pão em outra padaria.
Almoce mais cedo, jante mais tarde ou vice-versa.
Escolha outro mercado.
Outra marca de sabonete, outro creme dental.
Tome banho em novos horários.
Use canetas de outras cores.
Vá passear em outros lugares.
Ame muito, cada vez mais, de modos diferentes.
Troque de bolsa, de carteira, de malas.
Troque de carro.
Compre novos óculos, escreva outras poesias.
Jogue fora os velhos relógios, quebre delicadamente esses horrorosos despertadores.
Abra conta em outro banco.
Vá a outros cinemas, outros cabeleireiros, outros teatros, visite novos museus.
Mude. Lembre-se de que a vida é uma só.
E pense seriamente em arrumar um outro emprego.
Uma nova ocupação, um trabalho mais light, mais prazeroso.
Mais digno, mais humano.
Se você não encontrar razões para ser livre, invente-as.
Seja criativo.
E aproveite para fazer uma viagem despretensiosa, longa, se possível, sem destino.
Experimente coisas novas.
Troque novamente. Mude de novo.
Experimente outra vez.
Você certamente conhecerá coisas melhores.
E coisas piores do que as já conhecidas, mas não é isso o que importa.
O mais importante é a mudança, o movimento, o dinamismo, a energia.
Só o que está morto não muda!
Repito por pura alegria de viver: a salvação é pelo risco, a ousadia, a criatividade, o lúdico, sem os quais a vida não vale a pena!

(Edson Marques)

A SÍNDROME DO SAPO FERVIDO







Vários estudos biológicos já provaram que um sapo colocado num recipiente, com a mesma água de sua lagoa, fica estático durante todo o tempo em que aquecemos a água, até que ela ferva. O sapo não reage ao gradual aumento de temperatura (mudança de ambiente) e morre quando a água ferve. Inchadinho e feliz. Por outro lado, outro sapo que seja jogado neste recipiente já com a água fervendo, salta imediatamente para fora. Meio chamuscado, porém vivo.
Por alguma razão grande parte das pessoas tem um comportamento similar ao Sapo Fervido. Não percebem as explorações graduais que são feitas pelo sistema social, os patrões, os políticos... Acham que está tudo bem, a redução dos salários e o arrocho dos impostos é regular e normal, assim como a substituição da dignidade pelo vale transporte, o vale alimentação, o vale bunda, o vale...

Que a crise vai naturalmente passar. Que é só esperar um pouquinho, dar um tempo! E faz um grande estrago em suas vidas inteiras, “morrendo” inchadinhas e felizes, sem ter percebido as maldades vagarosas que vão acontecendo. Outros, graças a Deus, ao serem confrontados com estas, pulam, saltam, em ações que representam na metáfora, as mudanças necessárias e, muitas vezes, até inadiáveis.
Temos vários Sapos Fervidos por aí. Prestes a morrer, porém boiando estáveis e impávidos, na água que se aquece a cada minuto. Sapos Fervidos que não percebem que o conceito de governar, de estudar, ensinar, aprender, trabalhar, ter prazer, enfim, de viver, mudou. O método antigo “de obter resultados por meio da exploração das pessoas”, foi gradualmente substituído por “fazer as pessoas crescerem por meio do seu desejo, crenças, valores, bem-estar, conquista de seus sonhos, atingindo os objetivos que atendem a todos e satisfazendo as necessidades individuais e sociais".
Os Sapos Fervidos não percebem, também, que, como cidadãos precisam ter uma profunda reflexão intersubjetiva sobre os fatos e fenômenos e visão grandiosa dos processos que fazem desencadear quando falam, calam e se omitem. Não sabem, os coitados, que são os atores responsáveis por suas próprias histórias, e, o que é pior, resistem bravamente em sabê-lo. E que para isso, a sua vontade política precisa ser favorável ao crescimento global das pessoas com o espaço para o diálogo, para a comunicação clara, uma relação adulta e o desdobramento das relações ideológicas em tudo o que acontece e que deve ser analisado e criticado profundamente.
O desafio ainda maior está na humildade de atuar de forma coletiva e, principalmente, a serviço de todos, sem qualquer distinção.
Fizemos durante muitos anos o culto do individualismo e a turbulência exige, hoje, o esforço coletivo, que é a essência da eficácia humana, como resposta. Tomar decisões coletivas requer, fundamentalmente, muita competência interpessoal para o desenvolvimento das pessoas e a melhoria efetiva da qualidade de vida humana em sociedade. O que pede partilhar o poder, delegar, acreditar no potencial das pessoas, e saber ouvir, ter compaixão, respeito, carinho, afeição, calor humano e se colocar no lugar dos oprimidos, dos que sofrem com a nossa ação e a nossa ganância. .
Os Sapos Fervidos que ainda acreditam que o fundamental é a obediência e não a competência, que “manda quem pode, obedece quem tem juízo”, boiarão no mundo da produtividade, da qualidade, do livre mercado e das novas exigências que são impostas pela nova ordem mundial, a todos os seres vivos, sem exceção.
Acordem Sapos Fervidos, saiam dessa! O mundo mudou. Pulem fora antes que a água ferva. O Brasil, a sofrida humanidade, os horrores por que passa o planeta precisam de vocês. Ainda que meio chamuscados, mas vivos, felizes, cheios de sonhos, vontades, consciência crítica, sensibilidade e prontos para agir. Ainda há tempo para salvarmos o mundo do caos absoluto e definitivo, se tivermos pressa, para o que é necessário inicialmente que acordem, que pulem e, principalmente, que acreditem na força do amor.
_______________
Texto de Hayne Müller com tradução livre de Antonio da Costa Neto

O CENTÉSIMO MACACO


Um grupo de cientistas japoneses observou por mais de dez anos o comportamento habitual de uma espécie de macacos que habitava a ilha de Kochina, onde a batata doce, na condição de nativa e abundante, era o seu principal alimento, a qual era arrancada da areia e devorada instintivamente.
Estudando uma fêmea de um ano e meio de idade, constatou-se que um dia, brincando com suas batatas no mar, lavou-as ocasionalmente, livrando-as da areia da praia, saboreando-as em seguida. Percebendo que limpas, elas se tomavam mais saborosas e agradáveis, passou então a cultivar este hábito, ensinando também a sua mãe a fazê-lo. Isto foi sendo imitado por outros macacos, que gradativamente passaram a fazer o mesmo, incorporando esta inovação, lavando suas batatas antes de comê-las, chegando, por fim, a um centésimo macaco que, como os demais, incorporou ao longo do tempo o mesmo hábito.
Então, aconteceu o estalo mágico: o acréscimo da energia deste centésimo macaco rompeu de alguma forma a barreira ideológica, e o ato de lavar as batatas para comer, atravessou o mar. Colônias de macacos de outras ilhas, além de grupos espalhados por todo o continente começaram também a lavar as suas batatas antes de comê-las criando, por assim dizer, uma transformação de atitude, uma nova cultura instintiva ou uma mudança de paradigmas.
Assim, quando um certo número crítico de consciências, absorve e adota uma nova idéia, concepção, propósito teórico ou prático, essa nova consciência passa a ser transmitida de mente para mente, materializando-se na prática, transcendendo quaisquer tipos de barreiras e tornando-se real. O que significa que, quando apenas um número limitado de pessoas descobre um novo caminho, ele permanece como patrimônio do conhecimento desses poucos descobridores. Mas há um ponto em que se mais uma única pessoa sintoniza e absorve esse conhecimento, essa crença, o campo se amplia de modo que o novo saber é captado por todos, assumido e transformado, deslanchando para o campo da realidade, fazendo acontecer o sonho, a inovação, a nova perspectiva até então impedida, por razões energéticas próprias do universo, de se concretizar.
Talvez esteja faltando a sua parte, caracterizada pelo conhecimento, o desejo, a vontade e a ação para que se possa realizar muitos dos sonhos que certamente, podem ser também seus: um mundo melhor, harmonioso, cheio de paz, alegria, ar respirável, felicidades. Pense nisso e comece a transformar assertivamente seus sentimentos, palavras em atitudes convictas e carregadas de crenças, eivadas de saber, coração e alma. Lembre-se você pode ser o centésimo, ou seja, aquele que falta para que o desejo de todos possa se concretizar e nos encher a todos de bênçãos e de alegrias. Comece aqui e agora. Há sempre algo de bom e de bonito que se possa fazer. E o velho Universo pode se cansar de ficar esperando e desistir de tudo nos próximos minutos. Pense nisto e faça a palavra andar. Não foi por acaso que você leu até aqui.
Passe pra frente. Conquiste o centésimo. Faça a sua parte.
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Ken Keyner Jr. com tradução livre de Magda Beatriz de Almeida Mateucci
e adaptação de Antonio da Costa Neto