quarta-feira, 23 de maio de 2007

PROFESSOR ALDAIR AIRES





Aldair da Silveira Aires era, sem a menor sombra de dúvidas, um dos mais respeitados e brilhantes intelectuais goianos. Nascido e criado na cidade de Catalão; apaixonado pela mãe, o que tinha o maior prazer em deixar claro, público e em bom som. Mestre em literatura, reunia talentos que vão da primorosa prosa que escrevia à reconhecida verve poética, já publicada em vários livros. Dono de aguçado senso crítico sobre a política, a economia, a sociedade e de um poder de convencimento e persuasão bastante singular em todos os sentidos. No teatro, onde começou sua carreira artística, mobilizou a juventude para a produção de espetáculos que revelaram muitos talentos, até hoje, militantes dos palcos. Quando, à frente da Superintendência de Assuntos Culturais, no governo de Irapuan Costa Jr., foi um dos responsáveis pela transformação do então Cine Teatro Goiânia na casa de espetáculos que tanto nos orgulha. Cozinheiro de coração e com muita criatividade, recebia no seu restaurante, Forno de Barro, intelectuais, artistas e escritores para saborearem maravilhas que ele mesmo elaborava, incluindo aí o legendário “Peixe na Telha”, prato inventado por ele, hoje conhecido e muito apreciado nacional e até internacionalmente. Aldair pautava por ser uma pessoa espetacular, como poucas. Costumava dizer que tinha como filosofia o amor incondicional ao ser humano, o que demonstrou nos seus escritos, sua poesia, teoria e prática como educador, homem público, poeta, contista, conferencista, gente das artes, do teatro, educador, pai e amigo. E como as pessoas destas safras especiais, sofreu preconceitos e injustiças de toda a sorte, o que, inclusive, o levaram a mudar para a nossa pacata Silvânia, para onde trouxe muito da sua força, vigor, cultura, vontade política e sensibilidade.
Dizia ter o dom de apagar as coisas adversas vividas ou vivenciadas e seguir em frente, tendo fé no hoje, no aqui, no agora. E condenar veementemente quem poderia ter feito o bem e não o fez. Cheio de utopias e sonhos comuns aos bons intelectuais e artistas, como sempre foi, acreditava ainda no Brasil, sim. E como dizia: “mesmo com a lama derramada na esperança de um povo, precisamos ter certeza que o Brasil vai sair dessa".
Perguntado certa vez por um repórter do Jornal Opção sobre o seu aroma preferido, respondeu num sorriso largo e bonito: - “A essência de um gesto limpo, honesto, puro.” Ele repetiu sempre que a melhor receita para a vida era se apaixonar por ela e querer viver, no que foi extremamente coerente até sua última respiração num desejo louco de segurá-la, para que ela não fugisse, escorrendo por entre os seus dedos já enfraquecidos e pálidos.
Dizia detestar especialmente ter que enterrar vivos em seu coração, os falsos amigos, os amores falsos. Sempre difundiu a idéia de que o sentimento e a razão deviam caminhar juntos, pois isolados, afirmava, desintegram-se, se autodestroem. Entre os vários amigos que cultivou durante a vida tinha uma admiração especial por D. Belkis Espenciére Carneiro de Mendonça, a quem considerava uma pessoa da mais alta dignidade e um exemplo de mulher e de artista; a sua conhecida paixão pela poetisa goiana Yêda Shimaltz e o convívio fraterno com Aydenor Aires, Otavinho Arantes, Brasigóis Felício, Hugo Zorzete, Clarisse Dias e muitos mais.
Tinha como princípio “jogar o que não presta na fogueira das inutilidades e deixar que as cinzas sejam espalhadas pelo vento do esquecimento, como a falsidade, a calhordice dos que usam da ausência para manipular conceitos sobre os outros”.
“Os que vomitam titicas de suas cabeças porcas”. E sempre que tinha oportunidade complementava com um misto de ironia, humor e azedume: - “Vão, mas não me chamem para um comício político. Estou farto de babacas promessas vãs.”
A literatura, a cultura brasileira, goiana e silvaniense se despedaçam com a saída deste homem de cena. Todos perdemos e muito. “Não se fazem mais Aldaires como antigamente". E cada um que se vai é uma perda irreparável. Deixa um vazio imenso que jamais será preenchido por nada e nem por ninguém. Aldair trouxe também suas enormes contribuições aos governos municipais de Silvânia, a sua arte, poesia, literatura, artesanato. Talvez até sem o merecido reconhecimento.
Devoto confesso de São Francisco de Assis, quem ele jurava ser sua companhia constante em todos os dias e horas, guardando seu sono, seu trabalho, seus afazeres e sua vida. Ele parte, deixando lembranças bonitas de um artista que voa como anjo e esvai-se no céu, fundindo-se no azul do firmamento. Talvez ajude as estrelas a iluminarem a terra. Talvez seja iluminado por elas. Mas com certeza, deixa-nos um legado maravilhoso e leva com ele belezas incontidas e um sorriso-maroto-sonoro de dentes, bigodes, ombros e corpo inteiro.
Fui um dos primeiros silvanienses a conhecer o Professor Aldair, quando ele veio à nossa cidade no mandato do Prefeito José Denisson, para ministrar cursos de teatro, comunicação e literatura aos componentes do Grupo de Ação Comunitária – G. A. C. que, na época, comandava as atividades de educação, cultura, entretenimento e lazer que ocorriam na cidade. Chamaram-me à antiga XXIV Superintendência Regional de Educação e Cultura, que funcionava onde hoje fica a Biblioteca Municipal, para municiá-lo das informações de que necessitava para iniciar o seu trabalho. Vi aquele homem jovem, com sandálias franciscanas todas chapiscadas de tinta branca como a denunciar que ele teria feito alguma pintura enquanto as usava e fiquei fascinado com a sua simplicidade debaixo daquela sabedoria imensa. Ele confessou-me: - “Estou apaixonado por este lugar. Quando me aposentar venho morar aqui.” Dito e feito. Aldair não mentiu. Fez logo uma primorosa amizade com o nosso Zelly Nunes e sua família que foram os ícones que inicialmente o ligaram à nossa cidade e mais tarde, com D. Maria do Carmo, esposo e filhas, presenças de definitiva importância e indescritível calor humano em seus últimos anos de vida.
Agradecemos muito pela sua passagem por aqui e o que fez por Silvânia, a arte, a cultura.
Que você seja abençoado, reconhecido e gratificado por tudo o que realizou na terra. Pelas letras e artes, os palcos, os sons... Pelos sorrisos e alegrias que fez desabrochar. As vidas que deixou, suas lides de educador, ensinamentos, poesia, sua alma de um eterno garoto levado.
Silvânia agradece e já sente saudades e sua falta, acenando com um lenço branco para que o adeus possa não doer tanto e provocar menos lágrimas. E que elas sejam doces como as lembranças e os legados que você nos deixa.
A vida agradece. Agradecemos por você existir e ser um entre os nossos. Ou melhor ainda: sendo, eternamente, um de nós, um cidadão de nossas almas.

Antonio da Costa Neto

Um comentário:

Anônimo disse...

Sim, provavelmente por isso e