quarta-feira, 31 de outubro de 2007

COMO É DIFÍCIL FAZER O BEM....




A maturidade tem me ensinado que a pior, a mais difícil coisa do mundo é fazer o bem às pessoas. Tentar ajudar a humanidade a ser um pouco mais feliz, a ter paz, harmonia, ar respirável, água para beber, flores, bichos. Pois não são estas, as coisas mais simples, as que agregam a felicidade aos homens? Enfim, pobre humanidade que compete com o que deveria cooperar e coopera com o que deveria competir, num paradóxo absolutamente horrível, triste, lamentável. Ela ainda acredita e nem desconfia da ciência fria, da ABNT e as suas frescuras técnicas para que a produção científica não possa se propor a mais nada além dos seus rigores medíocres. Acredita nos políticos, na ONU, nas igrejas, no Rotary, nas escolas, nas instituições, nas leis feitas pelos ricos e poderosos... Como as pessoas pensam de forma tão pequena, medíocre, ridícula mesmo, à mercê de tantos desenvolvimentos tecnológicos e tal?
Vivo a síndrome do Antenor, do maravilhoso conto: O homem da cabeça de papelão, do extraordinário João do Rio. Nele, o personagem central que era um louco pelo bem, pela verdade, a harmonia e a justiça, a paz, era ridicularizado por todos e só consegue amizade, amores, posição social, dinheiro e prestígio, quando troca a sua cabeça privilegiada mas tida como louca, por uma de papelão; que lhe concede a virtude extrema de mentir, enganar, ludibriar, trapacear os demais com o lucro fácil, a lúxúria exasperada, a falsidade contínua, a injúria, o engodo. A humanidade gosta desesperadamente disto. Ela só apóia os que blefam e fazem de tudo para perpetuar o poder de poucos por meio da miséria, da fome, da dor, do sofrimento e da exploração de muitos.
Nos meus muitos anos de luta sempre tento ajudar a vida em sociedade ser um pouco melhor. Mas com o péssimo costume de querer que ela seja, de fato, melhor para todos, e, principalmente, para os que mais sofrem e mais precisam. Como educador, procuro dar aulas ativas, lúdicas, contextualizadas, atrativas. Quero levar os meus alunos a discutirem, a descobrirem a subjetividade, a serem sensíveis e críticos aos problemas da vida e do mundo. A agirem contra a hegemonia do capital sobre a vida, motivo pelo qual sou odiado pelas instituições, desprezado pelos colegas e esquecidos completamente pelos alunos. Escrevo, publico quando posso, elaborando textos, livros, artigos, resenhas, sempre com idênticas abordagens.
Nesta guerra, já conto na minha carteira de trabalho com exatas 36 demissões de faculdades e universidades e minto se disser que já recebi um único telefonema, ou mesmo um e-mail ou coisa parecida de aluno para saber se sobrevivo a tais momentos, não raro, desesperadores, de muitas lágrimas e sofrimentos que se repentem sempre.
Nunca fui convidado para assistir - muito menos para ser padrinho, paraninfo, estas coisas, embora a grande maioria dos alunos pareça gostar muito de mim, chegando às vezes a afirmar que fui o único professor a modificar suas vidas, agregando algum conhecimento realmente válido - a uma solenidade de formatura. Nunca. Embora trabahe em faculdades há 18 anos consecutivos, já sendo portanto, professor de também 36 (o mesmo número de demissões!!!) turmas de formandos, talvez um número carismático em minha vida.
Meus livros não estão nas estantes dos meus amigos, colegas e cúmplices com uma "educação por uma vida melhor", coisa que já conferi nas casas de cada um, depois de, lógico, tê-los dado de presente e autografados. Seria muito esperar que alguém comprasse um só deles...
Os pouquíssimos convites que recebo para participar de palestras e conferências, embora seja tão elogiado em minha produção científica, vêm sempre de pessoas que não conheço e por isso, convidam-me uma única vez. E depois somem, fazem caras e bocas. E se me encontram num shopping, numa feira, na rua, abaixam logo a cabeça para fingirem que nunca me viram. Pois seria comprometedor falar comigo em público, claro. Não é bom que saibam que convivo com este cara revolucionário, polêmico. Gosto das idéias dele, mas preciso preservar o meu empreguinho, na maioria das vezes, ridículo...mas...
Como consultor, meus projetos são sempre arquivados. Quase nunca recebo pelo menos um não sobre as propostas que faço para que as empresas sejam melhores, mais abertas, felizes, responsivas humana e socialmente. Para que priorizem os resultados aos processos, incluam, mas não exclusivisem o lucro, para que sobrevivam e contribuam para a felicidade humana, a preservação da natureza, a sustentabilidade.
O mesmo acontece com os poemas que escrevo, os quadros que pinto e que se querem, é ganhá-los, e, embora digam gostar tanto, ninguém nunca os indicou. Pois seria mais que assustador se eu chegasse a vender um sequer deles. Sinto mesmo que as pessoas temem muito o meu sucesso, que no final das contas, apenas redundaria, quero crêr, num mundo melhor e mais humano, com pessoas mais felizes e com menos dor, menos morte, violência, aquecimento global, coisas que a humanidade grita aos quatro ventos que quer tanto ver acontecer. Ou seja, as pessoas temem muito a felicidade, a alegria, o amor. Elas foram aliciadas pela mídia, a política, a igreja...para perpetuarem o caos no mundo, e, com isso, eternizar o mito de poucos, a concentração do poder e da riqueza, num ciclo absolutamente vicioso.
Daí as escolas que são feitas para "emburrecer" as pessoas, pois o capitalismo perverso só funciona com base neste engrediente e aí de quem ouse fazer o contrário. Os estatutos empresarais melosos e imbecilizantes, as estrutura de governo mantenedoras do positivismo doentio, com o que se aprazem as funcionárias - e funcionários - públicos afetiva e sexualmente mal resolvidas, os gestores de escola e professores solterões e frustrados, as mães de família que sonham com a autonomia, o trabalho, a liberdade, a vida própria, sendo, portanto, profundamente infelizes.
Claro que a humanidade inteira é má, perversa, ingrata. No que me incluo - pois não sou melhor e nem pior - e igualmente a minha família, meus amigos tão queridos, enfim toda a raça do ser humano. Enquanto isso, amargo a minha solidão e tento me convencer a mudar de ideia. Mas continuo feliz assim. É a minha forma de chorar sorrindo. Quem sabe ainda troco a minha por uma cabeça de papelão. Aí toda esta gente sórdida, certamente, se dobrará aos meus pés.


Antonio da Costa Neto

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