quinta-feira, 27 de março de 2008

DIVINO DE VIRGINÓPOLIS






Bem no meio da Vila,
a praça e o jardim,
jardim que no inverno de 54 minha mãe
coloriu com
flores de papel crepom para receber
a Virgem de Fátima
vinda de Portugal.
Ali fica a casa de varanda onde
Saturnina Parteira
me trouxe à luz.
Do lado esquerdo,
o bar do Homero, irmão gêmeo do Omar.
À direita, no começo do beco
o chafariz jogando água e a casa do Chiquitin.
Na frente do Chafariz a loja do Gemiro.
Uma casa depois da loja, a farmácia
do Zé Perpétuo
e na porta, Siô Tricate puxando com
os dedões o suspensório
e me encantava com as suas
histórias de além-mar.
A casa grande do Gilonório
e Vovô Solina que me calava o pranto.
A casa de Sá Remundinha com bambuzinho na escada
pra enfeitar altar e não deixar que as moças se casassem.
Depois da casa marrom do Lotário,
um ribeirão de água muito limpa
onde aprendi com a Tatana o ofício de lavar.
Um pouco na frente ficava uma casa branca
onde eu me agarrava às pernas de meu pai
com medo do barulho amedrontador da máquina de limpar café.
Subindo pela esquerda, o largo onde ficava
o Circo de Tourada do palhaço Piriá.
Lembro a rua comprida cheia de lama e poeira
até a Pensão da Vó Duzinha onde parava a jardineira,
seus jardins sempre floridos e as cascas dos ovos nas piteiras.
A casa do Bastião Ferreira quase em frente a do João Sérgio,
a Rita Preta, sempre risonha, com tição de fogo na mão
pitando seu pito de páia e rolão.
A casa enfeitada de Dona Benígna em frente a do Siô Caetano,
a casa bonita da Landinha.
A mesma Landinha que me fez doce a meninice
e doces fez meus batizados de bonecas.
O café do Quim da Cunha,
com seus velhos discos de vinil
fazendo a decoração das paredes.
A Pensão da Vó Figena, o viveiro do Vovô Raimundo
e o Teco-teco de Ti Tino.
A casa da Vó Carmelita que me ensinou a Tantun-Ergo
e as ladainhas em latim e o Vovô Serafim
tocando bonito sua clarineta.
A barbearia do Antonio Salvina a alfaiataria do Luiz Pinto,
o Zé Davi Ferrador junto da venda do Vavá.
Sá China na porta do Djalma,
de saia longa, chitadinha, a tudo espiava.
A casa do João da Mata onde eu comprava bolachas.
A venda do Zé Pena ao lado da casa do Zequita.
Em frente, morava o João Barriguinha
com seu barrigão e seu baláio de pão.
E subindo e descendo... e subindo e descendo...
A casa do Dr. Pena em frente da Zandrade
que tinha no quarto, fincada no chão,
uma bacia alta de banhar pagão.
A casa da D. Geni e da Angelina
que faziam imensos presépios
e aprontaram minhas asas de anjo.
A casa do Titin Ribeiro, a filharada do Pinguta,
as pomposas festas do Divino.
A alegria barulhenta do Gustin Fugueteiro,
o Jurandir Praxedes, o Prego, o instrutor da auto-escola,
sanfoneiro de nascença que me ensinava a cantoria de procissão.
No alto do morro, a Igreja Velha e seus altares dourados de ouro
ao lado da sacristia, o velho jasmim-manga
que encheu de perfume minha emoção ingênua e inocente.
Descendo o morro, a casa da Dona Conceição,
mãe dos quatro padres e de D. Aparecida,
minha professora, o jabuti que morava no seu jardim
e me carregava nas suas costas remendadas.
No morro da frente, morava Siô Jonas
soldado reformado, muito bem casado
com Dona Solteirice.
E eu sempre quis saber quem engomava tão bem os seus ternos de linho.
À Direita, o meu Rui Barbosa, o Grupo Escolar
e Dona Zilda, diretora, e eu, menina, e eu, professora.
O sobrado bonito do Chico de Sá Rita
pertinho de D. Nhanhá.
D. Paula e Siô Cesário no velho camapé
esperavam a velhice chegar vagando por toda a vila
lembrando a suave demência da Balbina.
Maria de Deus e do Bastião Cabiludo.
Quieta e brava, na rua de cima.
Mariana Precata, comia gambá.
Na rua de baixo, a casa azul do Pe. Francisco
rezando as missas e os scaramentos.
O Geraldo dentista e o seu torturante motor de pedal.
A casa do Chiquin Bitencourt, D. Geralda, tão alegre e miudinha
e na sua sala as cadeiras de palhinha.
A loja do Siô Zeca e do Julito,
a casa do Siô Deodato, homeopata
que veio a ser do Bastião do Cesaro e que era também o Correio.
Na frente, o perfumado manacá e na esquina o Café da Zilda Padilha.
A casa do Dundum, a loja do Expedito.
A casa sempre serena da Lica
e os seus cisnes brancos de crochê
nadando na mesinha alta de centro.
A venda do Teté
entre a casa do Lidu e do Altivo,
depois o Sobê, o Sadussanto que viveu pintando seus 101 anos.
A casa da D. Júlia, suas filhas de porcelana e a D. Maria Bárbara.
O coreto onde a banda tocava e onde se arrematavam
as prendas dos leilões,
os pudins enfeitados com rosas que só D. Lica sabia fazer.
Os pés floridos de murta que perfumaram de branco a minha infância
e os imensos jardins circundavam da velha Matriz,
cópia da Catedral da Espanha,
onde na pia, molhando minha cabeça,
e me chamaram Terezinha.
Terezinha, do Menino Jesus.
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Terezinha do Menino Jesus Soalheiro
Professora, mineira, a pessoa mais doce
do mundo, minha grande
amiga de Divinolândia de Minas,
hoje residente em
Governador Valadares - MG
















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