terça-feira, 23 de dezembro de 2014

FOI-SE MAIS UM ANO...



Foi-se mais um ano...
E com ele, uma quantidade incalculável de amores.
Cores, idades, alguns amigos,
não sei quantos neurônios.

Memórias, remorsos, desvarios, cabelos, ilusões, alegrias, tristezas.
Várias certezas
(se não me engano, treze).
Algumas verdades indiscutíveis.
Umas calças que não fecham mais.
E aquele vestido que eu gostava tanto.
Foi-se o meu gosto por espiar vitrines e achar graça.
Foi-se quase todo meu vidro de perfume.
Foi-se meu costume de imaginar asneiras à noite e junto

com ele a vontade que eu tinha de fazer sexo.
Foi-se meu forte instinto de acreditar no que me dizem
e de pensar que são realmente verdades
o que as pessoas que pondero, boas, me ensinam.
Ledo engano...
Foi-se meu açucareiro de porcelana. Que pena.
Foi-se o tempo em que uma simples farra não significava,
necessariamente, uma condenação
sumária a três dias em perfeito estado de coma.
Foi-se a poupança. O troquinho da gaveta.
Foi-se aquele antigo projeto
e com ele os sonhos de ser, de alguma forma, útil.
Foram-se exatamente, nove vírgula seis por cento
de todas as minhas esperanças, e, bem mais que isto,
dosmeus desejos de fazer coisas,
de gargalhar, de fazer felicidades.
Será que você não se cansa tempo?
Não pensa em tirar férias, dar uma pausa,
respirar um pouco?
Não lhe agrada a ideia de mudar
o andamento, diminuir o ritmo?
Em vez de tic-tac, inventar uma palavra mais comprida
para compasso, mantra, ícone, diagrama?
Já vi passar bem mais da metade
da minha vida que, me parece,
começou ontem. Por isso, olho pra
trás e não vejo quase nada.
Me diz sinceramente: para que tanta pressa?
Anda difícil acompanhar seus passos ultimamente.
Ainda mais agora que meus gestos são lentos,
minhas mãos mais pesadas, minha vista, turva e,
quase sempre, sinto dores
depois de qualquer caminhada.
Mas já é dezembro.
Foi-se mais um ano.
E com ele, quem sabe, mais uma doce fatia da vida.
Quem sabe, a última?...


___________________

(Texto de Adriana Falcão, in O doido da garrafa)

Um comentário:

João disse...

Olá, tenho 19 anos e me chamo João. Vim aqui após ler seu comentário publicado na postagem original desta matéria. Gostaria lhe pedir que você faça o uso dos mesmos pedestais que utiliza pra vangloriar a grandiosidade de suas ideias e de sua inteligência, para que, de cima dele, você possa visualizar um mundo melhor em que seus projetos possam vir a ter voz e onde você busque valorizar mais a sua própria vida. Clamar por uma piedade anônima aos seus estudos e a sua vida em uma (quase sempre) ignorada seção de comentários não leva a nada.
O que faltou naqueles pensadores foi subestimar a humanidade em relação a seus projetos, como se fossemos todos farinha do mesmo saco.
Não deixe que isso de afete.
Coragem.

(não publique isso, só reflita. Ou não, faça o que quiser.)