terça-feira, 24 de junho de 2014

COPA DO MUNDO: UM PROCESSO PARA ENGANAR TROUXAS




Estudei muitas ciências sociais, dediquei minha vida, praticamente, a isto. E sempre encontrei citações ligadas aos processos de ideologia de poder e de alienação das massas, tornando-as dóceis e facilmente exploráveis e dentro de tudo isto, figuram os esportes competitivos, o futebol, esta magia toda, este processo manipulador. Enfim  esta palhaçada que altera as relações de trabalho, a manipulação das pessoas, facilita e torna como natural a exploração, a covardia, os privilégios da burguesia e do capital contra as demais pessoas, exatamente, aquelas que se encantam, que glorificam, que lambem os pés dos mitos.
Da mesma forma, sempre tentei, como professor, consultor, estas coisas, passar para as pessoas um mínimo de senso crítico. Instrumentos para que elas entendam que, num momento como este, quanto mais a Seleção ganha, mais nós, o povo, os trabalhadores, as pessoas comuns perdemos e sofremos os resquícios que sobram de tudo isto: quanto mais a seleção ganha, mais pagamos nós, o povo.. Será que este quem corre atrás da bola, se encanta, se fantasia de verde e amarelo, para torcer cegamente, pelo Brasil, se não sabe, pelo menos não desconfia disto? Seríamos sim, um bando de conformados, de tolinhos, de cegos que mordem a isca e aplaudem seus algozes, se exasperam de alegria com tudo e ajuda, sem que saiba a construir a própria desgraça, a miséria, a fome, a opressão? Um povo tão esperto, por que não é também tão sábio?
E os meus amigos petistas que "tanto lutam" e têm a cara de pau de se fantasiarem para apresentar aqui suas caras de malucos-belezas híbridos de alienação política? E o governo petista, a mulher que nos governa e que se diz de esquerda, tendo a coragem  de jogar pelo ralo mais de 8 bilhões de reais, em troca do grito de gol, da alegria efêmera e da lavagem cerebral do povo quando faltam esparadrapo e macas nos hospitais públicos, os professores estão em greve e a violência mata proporcionalmente mais do que todas as guerras juntas? 
Escrevo agora, exatamente, na hora em que a seleção brasileira de futebol canta o Hino Nacional a alguns metros da minha casa, no Mané Garrincha, em Brasília. Galvão Bueno se rasga de emoção, pois faz parte dos que tiram milhões da boca das crianças pobres para constituir a sua fortuna pessoal, o que, é lógico, faz parte do grande e criminoso projeto de fazer com que os poucos ricos fiquem matematicamente mais ricos, o que requer que os muitos pobres fiquem, da mesma forma geometricamente, muito mais pobres. Ouço tudo sozinho em casa. Penso na Rose Marie que teve o azar de ter sua morte apagada com a glorificação da copa. Entendo, agora,  porque não consigo ensinar nada para este povo de consciências lavadas. Este povo que não entende, não quer entender e nem saber o caminho para se conquistar um mínimo de felicidade...  As pessoas são alienadas demais, muito omissas e encantadas com a celebridade econômica, por exemplo, do jogador que ganha milhões, justamente, para vender a falsa ilusão, onde o "nós somos um" invade a nossas almas para que nos sintamos, igualmente, ricos, poderosos e únicos. É que o poder psicológico constitui maravilhas simbólicas que justificam as misérias e o caos concretos. Mas não podemos, por razões óbvias, saber disto, é claro.
... Pronto, começou o jogo, abre-se assim os portões dos matadouros em que o gado em fila e de cabeça baixa, se encaminha para a morte, utilizando, aqui, a metáfora de Cecília Meireles. E compreendo, finalmente, que existe muita lona para o circo, o suficiente para cobrir todos os palhaços e seus aleijões da alma. A alma de um povo pobre, frágil e manipulado e que ainda se considera feliz, realizado e em paz. Afinal, o hexa vem aí e frente a isto, nada significam os problemas, as dores, os sofrimentos, as carências humanas e sociais. Somos um povo que aplaude  os mecanismos próprios de sua dor e de seu sofrimento e os fazem maiores ainda, por vezes, intransponíveis para muitos, talvez, para a absoluta maioria.
 Enfim, futebol e copa do mundo é sim, muito bom. É bom para o Felipão e o seu absoluto cinismo profissional, com seus milhões no bolso por fazer nada, mas induzir que fez tudo. Bom para os jogadores com status de celebridade porque chutam no gol e fazem inchar as redes, como se isso fosse tudo. Bom para os ricos, os milionários, a economia internacional, os algozes do mundo. Bom para o Galvão Bueno e suas táticas sedutoras para nos enganar, nos fazer de bobos e lavar nossas almas e nossas consciências nos tornando cegos a respeito de tudo. Só o que vale é a Copa, os gols, o quanto mais melhor, exatamente como querem os ricos, os capitalistas, a Globo, os donos do circo.
Quanto a nós, "o resto", resta-nos abaixar para apanhar nossos cacos que restarão depois de tudo, do júbilo vazio, da alegria efêmera do grito de gol de um mundo inteiro que está pronto para ser consumido, explorado, vendido a qualquer preço, É só lavar a maquiagem em verde e amarelo e começar tudo de novo. Trabalhar, juntar tostões, gastar na copa que há de ver e morrer à míngua, por bala perdida, na fila dos hospitais, sem emprego, sem teto, lazer, educação, sem nada. E tudo mais que lava nossas almas e nos deixa sempre prontos para os sofrimentos outros e muitos maiores que se ocultam nas dobras da magia deste futebol tão importante e tão encantador. 
Estamos perdidos, não sabemos mais o caminho da saída. Resta, portanto, a esperança de que a seleção perca, senão o jogo, mas a Copa, a famigerada taça de tantos encantos. Assim, o Brasil ganha. Faz um atalho mais curto e mais lúcido para saída que tanto esperamos mas, que comprovamos com este pensamento primário de "lambedores de botas" que não merecemos, nem de longe a felicidade social, a cidadania, enfim, uma vida em paz.  Somos sim, bem preparados para sermos uns idiotas. Enquanto isto, os poderosos dão risadas de nossas caras de palhaços desengonçados, famintos e, absolutamente, sem a menor graça.

Antonio da Costa Neto
antoniocneto@terra.com.br

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