segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

domingo, 11 de dezembro de 2011

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

PARA SE VIVER UM NOVO ANO NOVO


O cérebro humano mede o tempo por meio da observação dos movimentos. Se alguém colocar você dentro de uma sala branca vazia, sem nenhuma mobília, sem portas ou janelas, sem relógio... Você começará a perder noção do tempo. Por alguns dias, sua mente detectará a passagem do tempo sentindo as reações internas do seu corpo, incluindo os batimentos cardíacos, ciclos de sono, fome, sede e pressão sangüínea.
Isso acontece porque nossa noção de passagem do tempo deriva do movimento dos objetos, pessoas, sinais naturais e da repetição de eventos cíclicos, como o nascer e o pôr do sol. Compreendido este ponto, há outra coisa que você tem que considerar: nosso cérebro é extremamente otimizado. Ele evita fazer duas vezes o mesmo trabalho.
Um adulto médio tem entre 40 e 60 mil pensamentos por dia. Qualquer um de nós ficaria louco se o cérebro tivesse que processar conscientemente tal quantidade. Por isso, a maior parte destes pensamentos é automatizada e não aparece no índice de eventos do dia e portanto, quando você vive uma experiência pela primeira vez, ele dedica muitos recursos para compreender o que está acontecendo. É quando você se sente mais vivo. Conforme a mesma experiência vai se repetindo, ele vai simplesmente colocando suas reações no modo automático e "apagando" as experiências duplicadas.
Se você entendeu estes dois pontos, já vai compreender porque parece que o tempo acelera, quando ficamos mais velhos e porque os Natais chegam cada vez mais rapidamente. Quando começamos a dirigir automóveis, tudo parece muito complicado, nossa atenção precisa ser requisitada ao máximo. Então, um dia dirigimos trocando de marcha, olhando os semáforos, lendo os sinais ou até falando ao celular ao mesmo tempo. Como acontece? Simples: o cérebro já sabe o que está escrito nas placas (você não lê com os olhos, mas com a imagem anterior, na mente). O cérebro já sabe qual marcha trocar (ele simplesmente pega suas experiências passadas e usa, no lugar de repetir realmente a experiência).
Em outras palavras, você não vivenciou aquela experiência, pelo menos para a mente. Aqueles críticos segundos de troca de marcha, leitura de placa... São apagados de sua noção de passagem do tempo... Quando você começa a repetir algo exatamente igual, a mente apaga a experiência repetida. Conforme envelhecemos, as coisas começam a se repetir- as mesmas ruas, pessoas, problemas, desafios, programas de televisão, reclamações...
Enfim... as experiências novas (aquelas que fazem a mente parar e pensar de verdade, fazendo com que seu dia pareça ter sido longo e cheio de novidades), vão diminuindo. Até que tanta coisa se repete que fica difícil dizer o que tivemos de novidade na semana, no ano ou, para algumas pessoas, na década. Em outras palavras, o que faz o tempo parecer que acelera é a... r-o-t-i-n-a. Não me entenda mal. A rotina é essencial para a vida e otimiza muita coisa. Mas a maioria das pessoas ama tanto a rotina que, ao longo da vida, seu diário acaba sendo um livro de um só capítulo, repetido todos os anos.
Felizmente há um antídoto para a aceleração do tempo: M &M (Mude e Marque). Mude, fazendo algo diferente e marque, fazendo um ritual, uma festa ou registros com fotos. Mude de paisagem, tire férias com a família (sugiro que você tire férias sempre e, preferencialmente, para um lugar quente, um ano, e frio no seguinte). E marque com fotos, cartões postais e cartas. Tenha filhos (eles destroem a rotina) e sempre faça festas de aniversário para eles e para você (marcando o evento e diferenciando o dia).
Use e abuse dos rituais para tornar momentos especiais diferentes de momentos usuais. Faça festas de noivado, casamento, 15 anos, bodas disso ou daquilo, bota-foras. Participe do aniversário de formatura de sua turma. Visite parentes distantes, entre na universidade com 60 anos, troque a cor do cabelo, deixe a barba, tire a barba, compre enfeites diferentes no Natal. Vá a shows, cozinhe uma receita original, tirada de um livro novo. Escolha roupas inusitadas, não pinte a casa da mesma cor, faça diferente.
Beije e morda sua paixão, mas não tire pedaços e viva com ela momentos loucos, estarrecedores, lúdicos, radicais. Vá a mercados alternativos, leia livros escandalosos aos olhos tolos de muita gente. Busque experiências novas. Não seja igual a ninguém. Se tiver algum dinheiro - não precisa muito - especialmente se já estiver aposentado, vá com seu marido, esposa ou amigos para outras cidades ou países. Abandone o slogan do "politicamente correto", seja tudo, menos, careta. Veja outras culturas, visite museus estranhos, deguste pratos esquisitos... em outras palavras... E, se possível, usando outros métodos, mas...V-I-V-A I-N-T-E-N-S-A-M-E-N-T-E.
Porque se você viver intensamente, o tempo vai parecer mais longo. E se tiver a sorte de estar casado(a) com alguém disposto(a) a viver e buscar coisas surpreendentes, seu livro será muito mais longo, muito mais interessante e muito mais v-i-v-o... do que a maioria dos livros da vida que existem por aí. Fale palavrões, escreva versos, pinte quadros. Cerque-se de amigos com gostos especiais, vindos de lugares outros, com religiões atípicas e que gostam de comidas com sabores exóticos. Gente que sabe respirar em falsete, faz amor de todas as formas, em lugares ousados, correm riscos, amam aventuras e gargalham de desmaiar frente a quaisquer preconceitos... Dê preferências às que riem de si mesmas, que não têm dificuldades para enfrentarem o tanque de roupas, vender cachorro-quente, lavar banheiros, etc.
Lembre-se que as melhores companhias são as pessoas descontraídas, que gostam de cachorros, de gatos, que falam alto e que saem de sandálias havaianas mesmo para serem fotografadas para um jornal importante. Amizades com pessoas assim não têm preço.
Enfim, acho que você já entendeu o recado, não é? Boa sorte em suas experiências para expandir seu tempo, com qualidade, emoção, rituais e vida. Abomine a mesmice, peça demissão da mediocridade. Nós só vivemos uma vez e é preciso que seja com a emoção possível. E esta só vem quando quando não perdemos a oprtunidade de fazer o bem e não servimos de obstáculo para quem quer e insiste loucamente em fazê-lo.

(Airton Luiz Mendonça - com adaptações minhas)

BRINCANDO DE FAZER PALAVRAS, DO LIVRO POEMAS PARA OS ANJOS DA TERRA


Brincando de Fazer Palavras

Antonio da Costa Neto


Não que eu mereça,
mas gosto de me sentir amigo
de Manoel de Barros.
E como dois moleques de cabelos brancos,
nós brincarmos de inventar palavras:
- colocá-las para voar;
- fazer cócegas na barriga delas;
- encher as mãos e as fazer derramar
como se fossem água fresca, limpa e aos borbotões.
Nós as bebemos e elas escorrem pelo queixo,
matando a sede de beleza, de sabedoria.
Depois, as arranjar em filas como formigas
que, em procissão, somem no meio da aboboreira
de flores amarelas e pesados frutos no chão.
Nós dois e as palavras brincamos com o barro
fazendo esculturas, passarinhos, borboletas
e outros seres iluminados de braços e asas abertas.
Prontos para invadirem o infinito das almas.
Aí, nós voamos com elas, no tapete mágico
que a gente tece dentro da mente.
Cruzando os fios dos pensamentos e dos sonhos,
alinhavando sílabas, pontuando versos.
E com tudo isso, faremos um manto imenso e brilhante.
Só de poesia, renda, brocados e fitas, repleto de muito
poder e glórias para vestir este mundo
nu, ao relento e morto de vergonha.
Meu amiguinho, muito melhor do que eu,
consegue com elas, tudo,
como o senhor, o mago,
a quem elas, prontamente, obedecem e atendem.
Enquanto isto, eu, aprendiz,
vou tentando correr atrás das palavras,
remendá-las em poesias
para tentar contar histórias
e, se possível, encantar a vida.

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(*) Do livro, ainda inédito: Poemas para os anjos da terra.

sábado, 3 de dezembro de 2011

POEMAS PARA OS ANJOS DA TERRA, MEU NOVO LIVRO: SÓ UM APERITIVO







PREFÁCIO


Antonio, um excelente fazedor de versos


A cidade de Bonfim, atual Silvânia, um dos primeiros arraiais do ciclo do ouro, partícipe da interiorização civilizatória ocidental, nas futuras terras goianas, quando de mala e cuia, Anhanguera, Filho, marchou em seu segundo retorno (1726) para aqui permanecer e, definitivamente, misturar-se à terra tão sulcada por ele, em busca do seu precioso metal amarelo, a 19 de setembro de 1740, é o berço paridor do escritor Antonio da Costa Neto e de tantos outros grandes nomes da literatura brasileira.


Até então, cerca de alguns meses, confesso que não sabia da existência cultural de Antonio da Costa Neto, ele, amigo de alguns dos meus amigos de produção literária, ainda não havíamos nos encontrado. O bom culpado, disso tudo, foi um poema que escrevi e publiquei, em meu livro Licores da carne, de título: o descascador de amêndoas, que ainda não sei como foi habitar as páginas do blog do Antonio: mudandoparadigmas.blogspot.com, emoldurado por ele, com referências elogiosas ao meu texto. A chegada do meu e-mail na caixa eletrônica do Antonio, agradecendo a sua generosa crítica, aos meus versos, trouxe-me em resposta, o convite para prefaciar seu livro: Poemas para os Anjos da Terra, prontamente aceito por mim, pedindo-lhe a compreensão de certo tempo para essa feitura para que antes pudesse cumprir uma série de compromissos literários previamente agendados.


Depois de uns dois meses, iniciei a leitura dos seus versos. A poesia ao contrário da prosa, a sua resposta de leitura, é muito imediata. Foi, assim, numa leitura de quem toma o elevador e desce no último andar dessa construção poética que se deu o meu embarque gustativo e estético desse lavrador de poemas silvaniense, radicado em Brasília. Feliz, porque não dizer, eufórico, encontrei um poeta dotado de extrema habilidade para trabalhar com muita personalidade as impressões da sua vivência infantil, adolescente e, agora, adultamente interpretada, acolhidas com uma ternura tão própria e confessa sem meias-palavras, portadoras uma essência poética ricamente bem-trabalhada, incorporando palavras.


Suas lembranças sensoriais afagam bichos, plantas, comidas e gente em todos os seus trejeitos – muito em especial a sua origem afro-brasileira (minha também) – acomodando seus parentes, num terno mosaico familiar. Antonio da Costa Neto, muito privilegiado, viveu com farta intensidade seus primitivos ciclos carnais. Eles tão próximos aos meus e que durante a leitura dos seus poemas, suas tias, seus avós, não eram somente seus, eram meus avós, minhas tias, madrinhas, professoras que ele buscou em sua existência para universalizar poeticamente com perfeita realização.


Não é pelo fato de sermos filhos de uma mesma geração, de uma mesma origem continental, de cidades próximas, ele, de Silvânia, e eu, da minha Pires do Rio, que me emocionei ao ler seus versos. Nunca misturei minhas emoções pessoais para criar ou inventar estética poética, dar qualidade literária ao que não existe. Antonio é, sim, um excelente fazedor de versos.


O educador por profissão, Antonio da Costa Neto é a grande revelação poética dos meus encontros cotidianos com a poesia neste 2011. Foi um grande presente que recebi dele, ao ser convidado para apresentar este seu livro. Sem dúvida, também, um presente enriquecedor da produção poética do Planalto Central à poesia brasileira.



Ubirajara Galli

Membro da Academia Goiana de Letras


e do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás




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Meu Reino

O quintal da casa
da minha vó era grande.
Quase uma fazenda.
Junto às cercas de arame farpado
o capim ficava grande
e emoldurava a paisagem lá fora: casinhas, morros, postes, serras...
O tanque rodeado de moças e conversas,
mãos espumadas, batedor surrado
e varal tão cheio quanto o cansaço dos corpos.

Minha tia reclamava: - “Gente, estou mais morta do que viva”.

E ia se deitar mais cedo.

No outro dia acordava se espreguiçando e dizendo

que dormiu como uma pedra. Ai, que saudade...
Laranjeiras, cachos de banana, roseiras, margaridas, pés de pimenta.
Chuchu trepado no pé de manga, lá encima.

Abacateiro, flor de manacá espalhando aquele cheiro bom de esperança.
Galinhas, jabuticabas, moitas de bananeiras fresquinhas e úmidas,

onde a galinhada preferia fazer seus ninhos.
Gato malhado e tocas de passarinhos. E a gente contando os ovos,
vigiando os filhotes nascerem.
Era só alegria ajudar dona sabiá deixando comidas
nos galhos das árvores e ficar espiando escondido.
Eu fazia isso e achava que já tinha ganhado o céu.
Não precisava mais rezar e nem fazer penitências.

Tinha preguiça de ir à missa
e fugia para ir espiar o Rio Vermelho nas manhãs de domingo.
Minha mãe desconfiava da minha cor morena

porque dentro da igreja não tinha sol.
Eu me fazia de desentendido e ia levando.
Corria para a casa da minha vó

e ganhava a barraquinha de despejo lá no fundo do quintal.
Me deliciava com o cheiro da lenha guardada há anos e dos bichos,
dos sacos de arroz e feijão empilhados. Queijos, rapaduras, muita farinha.
Dos pés de milho e dos tempos das pamonhas: de doce, de sal, de canela,
de pimenta com linguiça, frita, assada, cozida.
Minha vó ria suave e enrolava o cabelo no alto da cabeça,

prendendo com um pente preto com pedrinhas brilhantes.
Ela escondia a chave da despensa na alça da combinação
pra gente não roubar seus doces, bolos e biscoitos.
E antes de dormir; segurava nas mãos de Nossa Senhora da Guia,
pedia bênçãos e fazia o sinal da cruz rezando em voz alta

(que era pra santa escutar).
Apagava a luz, se deitava e ficava pensando:

nos filhos, nas dívidas, nos problemas...
De vez em quando dava um suspiro tão fundo que doía na alma.
A gente escutava passos na rua e ficava imaginando de quem poderia ser.
Às vezes ouvíamos vozes que davam para ser reconhecidas.
Eu era bem feliz porque tinha minha vó,

uma fortaleza a me proteger, me dar moedas.
Contar estórias como as da moça que se encantou,

do bezerrinho medroso e do peixe que sabia falar.
Tinha silêncio pra dormir, o escurinho do quarto e festa no coração.

E, amanhã, certamente, aquele quintal inteiro seria o meu Reino...
Eu, majestade, seria feliz entre cercas de arame, galinhas, gatos,
passarinhos, flores de abóbora e roupas branquinhas, cheirosas, lavadas
por minhas tias bonitas e ancudas.
Minha vó trançando os cabelos, calada, com os grampos na boca
e rezando em silêncio, cochichando, bem baixinho.

Enquanto eu achava que era para a gente ficar
rico e o meu pai poder ir pescar todos os dias, o dia todo,

que era o que ele mais queria na vida.
Eu, menino, brincava no quintal e nem pensava em outra coisa na vida.
E era muito mais feliz do que os reis da Suécia, da Espanha, da Inglaterra...
Mas muito mais mesmo.
(Ainda mais agora que eu sei que ser rei de verdade não tem aquela graça toda).
Bom mesmo era reinar no quintal-fazenda de minha vó.

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Meu Padrinho Nenem da Costa

Tinha voz de melado de cana.

Alma de melado de cana.

Jeito de melado de cana.

Era mole pra beber que era uma coisa,

qualquer dose de cachaça com arnica

que tomava como remédio,

preparado por madrinha Martinha,

(que Deus a tenha num trono dourado)

meu Padrinho já caía de bêbado...

E virava menino, repetindo o tempo todo:

- “ Eu quero minha espingarda infantil.

Eu quero minha espingarda infantil!...”

O que me dava um misto de dó e de graça.

Meu padrinho morreu novo

e tinha no peito um coração

de torrão de açúcar

(que não chegou pra quem quis).

Era...um doce de pessoa.

Quando o doce é cobiçado demais

acaba cedo.

Vai embora logo.

Igual ao meu padrinho

o que desapareceu no horizonte

depois do ponto azul do infinito.

Onde ele parou, virou pra mim, sorriu macio,

colocou o chapéu, me deu adeus.

Pegou sua cabaça d’água e amarrou calmamente na cintura.

Jogou nas costas a enxada, o enxadão, a foice.

E foi plantar feijão e milho,

cortar cana, fazer melado, açúcar, rapadura, manuê

para adoçar o paraíso celestial, a casa de Deus.

E nunca mais voltou.

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Conversinha Boa com Inácio Lôbo

- Eu já prantei o argudão, num prantei?

Eu já panhei, num panhei?

Eu já discarocei, num discarocei?

Eu já cardei, num cardei?

Eu já fiei, num fiei?

Eu já meiei, num meiei?

Eu já tingi, num tingi?

Eu já nuvelei, num nuvelei?

- Então, agora eu vô “pu tiá!”

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Tabela de Saliença de D. Antonia Bacada

Toda a minha geração de meninos

“perdeu a virgindade”

na casa de D. Antonia Bacada,

bem ali, ao lado do Cemitério.

(espero que me perdoe por usar aqui o apelido que odiava).

A gente entrava, sorrateiramente, pé-anti-pé, pelos fundos,

morrendo de medo de ser visto

e dava logo de cara com um cartaz na parede da cozinha,

que dizia, com uma letra feia e muitos erros:

TABELA DE SALIENÇA

Isso.........10 cruzêro.

Aquilo.....5.

Aquilo Outro...7,50.

Serviço Completo....15.

Etc. Etc. Etc.

Era o que ela cobrava pra brincar

com as suas meninas.

Cada um de nós tinha a sua preferida.

Eu, por exemplo, gostava muito da Luzia Fogoió,

porque além de loura, ela era fofinha,

gorda, repolhuda e muito farturenta.

Assim, as coisas ficavam muito mais fáceis

e eu, coitado, me gabando de bam-bam-bam.

Outros ficavam loucos pela Alzirona, desconfio,

até, que pelos mesmos motivos.

Tinha gente que eu nem posso dizer o nome

que adorava a Dercília e ficava horas na fila

esperando a moça terminar o serviço,

tomar o seu banho tcheco e se refazer

para a nova jornada que ia pela noite a dentro.

O que nos obrigava a fazer contas e mais contas

pois todo o mundo queria o tal “serviço completo”...

E o dinheiro era curto para tanta despesa.

À noite era melhor, pois a gente soprava a lamparina,

entregava o dinheiro – bem abaixo do combinado –

e saia correndo pela rua a fora.

Este era o enigma, porque nós, os homens,

tínhamos tanta facilidade para entender a matemática nas aulas.

A gente tirava notão e passava tranqüilo.

É, D. Antonia Bacada deveria ser homenageada como educadora

e o seu nome ser colocado em alguma escola da cidade.

Ensinava matemática com teoria e prática.

Bem melhor do que muita professora formada

e a gente aprendia que era uma beleza.



sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

FOI-SE MAIS UM ANO...

Foi-se mais um ano...
E com ele, uma quantidade incalculável de amores.
Cores, idades, alguns amigos,
não sei quantos neurônios.

Memórias, remorsos, desvarios, cabelos, ilusões, alegrias, tristezas.
Várias certezas
(se não me engano, treze).
Algumas verdades indiscutíveis.
Umas calças que não fecham mais.
E aquele vestido que eu gostava tanto.
Foi-se o meu gosto por espiar vitrines e achar graça.
Foi-se quase todo meu vidro de perfume.
Foi-se meu costume de imaginar asneiras à noite.
Foi-se meu forte instinto de acreditar no que me dizem
e de pensar que são realmente verdades
o que as pessoas que pondero, boas, me ensinam.
Ledo engano...
Foi-se meu açucareiro de porcelana. Que pena.
Foi-se o tempo em que uma simples farra não significava,
necessariamente, uma condenação
sumária a três dias em perfeito estado de coma.
Foi-se a poupança. O troquinho da gaveta.
Foi-se aquele antigo projeto
e com ele os sonhos de ser, de alguma forma, útil.
Foram-se exatamente nove vírgula seis por cento
de todas as minhas esperanças, e, bem mais que isto,
das minhas vontades de fazer coisas,
de gargalhar, de fazer felicidades.
Será que você não se cansa tempo?
Não pensa em tirar férias, dar uma pausa,
respirar um pouco?
Não lhe agrada a ideia de mudar
o andamento, diminuir o ritmo?
Em vez de tic-tac, inventar uma palavra mais comprida
para compasso, mantra, ícone, diagrama?
Já vi passar bem mais da metade
da minha vida que, me parece,
começou ontem. Por isso, olho pra
trás e não vejo quase nada.
Me diz sinceramente: para que tanta pressa?
Anda difícil acompanhar seus passos ultimamente.
Ainda mais agora que meus gestos são lentos,
minhas mãos mais pesadas, minha vista, turva e,
quase sempre, sinto dores
depois de qualquer caminhada.
Mas já é dezembro.
Foi-se mais um ano.
E com ele, quem sabe, mais uma doce fatia da vida.
Quem sabe, a última?...

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(Texto de Adriana Falcão, in O doido da garrafa.
Com complementações minhas que não sou bobo nem nada...)