EDUCAÇÃO & ESCOLA:
PARA QUE E PARA QUEM?
CONTRA O QUE E CONTRA QUEM?
Antonio da Costa Neto
As raízes da crise na educação brasileira vêm, logicamente, desde que
ela foi criada para a manutenção do paradigma colonizador e explorador europeu.
Fundamentada, posteriormente, na ideologia norte-americana, que as fortalece,
estabelecendo o ensino como mercadoria e a escola como fábrica de operários e
de consumidores em potencial. Pois, quem subjuga o trabalho e o pão, tem o
controle e dita as normas, no sentido de garantir e ampliar as suas próprias
benesses, e, assim, sempre. Ou seja, escola e educação fundem-se em uma única
instituição burocratizada e antagônica aos interesses do projeto social maior.
Mantida para gerir modelos econômicos internacionais e os interesses das elites
capitalistas de todo o dito mundo civilizado.
É urgente a necessidade de se ampliar os laços do compromisso da boa
educação com o humano e o social, para a garantia de sua legitimidade. Não
podendo mais ter a educação como uma ação fechada num processo mecanicista que
a molda, inexoravelmente, para legitimar a acumulação do poderio econômico e
cultural, conforme Apple (1989) e, manter, com isto, os privilégios do capital
sobre o trabalho e da técnica sobre a vida.
É o contexto das ideologias, que, segundo Chauí (1990), opera, tanto na
prática como na teoria educativas, e, que, para entendê-lo precisamos de outro
olhar muito mais concreto para dentro da vida das instituições que formatam a
educação e fazem-na acontecer. Constatando, assim, o seu esmagador poder de
controle sobre as pessoas. O que acontece, não apenas por meio de currículos e
conteúdos, mas nas suas múltiplas e dissimuladas formas de ação e de
metodologias de ensinar e de aprender, associando-se a isto, a sua cultura, a
sua negação de um projeto, enfim, o clima e o cotidiano das escolas “educando
os indivíduos” para comandar e controlar massas sociais inteiras. Mantendo e
classificando como normal a exploração de poucos sobre muitos, e, logicamente,
as suas consequências em todos os segmentos da vida.
Precisamos, com urgência, perceber a progressão histórica de nossa
formação. E, sem sermos reducionistas, compreender nossas mudanças históricas,
crises e associações feitas no conteúdo e nas formas ideológicas; paradigmas,
que são, em parte, gerados pelas escolas e por elas, perpetuados, na maioria
das vezes, de maneira ingênua, e, até, inconsciente. Assim, de acordo com
Santiago (1996) a educação facilita os processos de organização e controle do
trabalho na sociedade. Entre eles a separação – e a valorização – entre o
trabalho manual e o intelectual. O divórcio entre a concepção e a execução está
sempre constituído sob formas complexas e paradoxais na educação, até o
presente momento. O que requer medidas corretivas eficientes e mais do que
imediatas. Como no dito popular: para ontem.
As escolas parecem fazer uma série de coisas com vistas ao
desenvolvimento das pessoas e da sociedade como um todo. Mas, na verdade, elas
são órgãos reprodutivos do caos e da exploração, na medida em que ajudam a
selecionar e a titular a força de trabalho. E elas, sem que percebam, fazem
mais do que isto. Ajudam a manter os privilégios por meios culturais; ao tomar
a forma e o conteúdo da cultura e do conhecimento dos grupos poderosos e
defini-los como um conhecimento legitimo, a ser preservado e transmitido a
todos. E o fazem com a maior eficiência – o maior cinismo – nos métodos que
dissimulam com a muita naturalidade, inclusive. Quando se discutem ciências,
tecnologias do conhecimento e coisas afins, parece descabido entender o atraso
absoluto das escolas - em todos os níveis - neste sentido. Elas ainda se
esforçam, sem que saibam, para manter e ampliar a exploração do capital sobre o
trabalho, legitimando a opressão, a hierarquia, a segregação do poder de
decidir, do bem-estar para aqueles que elas, por motivos óbvios dizem existir:
ou sejam, os seus alunos. Engendrando, com isto, uma das maiores mentiras
históricas que a humanidade ainda conta e faz acreditar.
Elas são, também, agentes no processo de criação e recriação de uma
cultura dominante eficaz. Ensinam normas, valores, definições e uma certa ordem
que contribui para a hegemonia ideológica dos grupos dominantes. O que tem,
inclusive, levado a vida a padrões quase que insustentáveis. Gerando miséria,
fome, desemprego, degradação ecológica, violências, crimes, corrupção, apenas para
exemplificar. A educação, por seus instrumentos, pode, assim, atuar como
legitimadora importante da ordem social existente. Pois, a sua vida cotidiana
reforça aqueles valores meritocráticos que justificam a distribuição de
recompensas diferenciadas e a separação entre bem-sucedidos e fracassados.
Propiciando lições diárias de desigualdades gritantes e de injustiças enormes.
As práticas pedagógicas e curriculares usadas para organizar as suas
rotinas são responsáveis, em grande parte, pelos fenômenos que fazem com que os
estudantes internalizarem o fracasso. Transformando-os em desajustados,
conforme lembra-nos, belamente, em sua conspiração aquariana, Ferguson (2010).
Reconduzindo, finalmente, a trajetória da exploração fácil, e, com ela, toda
uma crise de valores, em que, enquanto cidadãos do mundo, nos achamos
mergulhados. A escola ajuda a retirar a consciência crítica. Bem ao contrário
do que pensa fazer e o que tem amplamente divulgado por meios das mentiras
operacionais e sua complexa burocracia. Enfim, a escola, como aparelho
ideológico a serviço do Estado opressor, exerce uma função que produz agentes e
valores, disposições e ideologias “apropriadas”. Transmitidos por formas
ocultas – ou paradigmas – para responder aos interesses de uma sociedade e de
uma economia iníquas. E, em seu currículo oculto, ela tenta ensinar aos seus
alunos com uma imposição particular de passividade, servidão, obediência e
outros princípios de raiz de poder e de economia. A verdadeira tarefa dos
alunos é a de sobreviver até que o sinal soe (Toffler, 1980).
A análise deste conjunto de coisas pode nos fornecer pistas que nos
ajudem a avançar no entendimento, tanto das funções sociais da educação e da
escola, quanto dos valores por elas promovidos. Devemos entender, portanto, que
o seu único, ou, pelo menos, o seu maior problema, é o ideológico, o que é bem
o discurso do conhecido e respeitado Senador da República, Cristóvan Buarque.
Sendo esta, uma grande questão de paradigma. E, somente, tendo uma visão muito
mais refinada do que realmente as escolas fazem, na teoria, na prática, nas
suas políticas e diretrizes, é que poderemos a começar a lidar com a série de
mudanças que estão sendo aqui propostas. Precisamos entrar na escola e
observar tudo isto de frente, sem medo, ou restrições. Analisando o funcional,
o político, sua filosofia, seus interesses, para o quê, os educadores e
pedagogos - principalmente estes - precisar despir suas máscaras de incautos e
inocentes revestida na brilhante lavagem cerebral com que a absoluta maioria
das faculdades de educação os (de)formam para tal embate . Devemos descobrir
que significados, normas e valores os estudantes, professores, técnicos,
auxiliares, diretores e todas as pessoas, realmente, nelas experienciam. Apenas
pesquisando esta série de fatos é que poderemos começar a agir. E, para isto,
falta muito para formatarmos a nossa visão e a nossa consciência. Por enquanto,
nós educadores somos uma massa humana ingênua demais neste sentido, o que, é
claro, faz com que sejam cumpridos os princípios ditos educativos com os quais
deleitam o estado opressor e ocultamente escravocrata. Só não enxerga quem não
quer (Costa Neto, 2009).
Não é necessário grande esforço para observarmos que a educação em geral
e a escola, em particular não avançaram dentro desta filosofia ao longo dos séculos
de história. Pelo contrário, todo o esforço é feito para dissimular este
vergonhoso atraso. Elas não evoluíram tanto quanto as demais áreas da
atividade humana, mas conseguiram fingir e representar bem demais. E o pouco
modificado, o conservador cotidiano da escola, ainda é o mesmo de muitas
décadas, séculos, talvez milênios, se relativizarmos o entendimento de tal
denominação. Claro que elas possuem hoje outros métodos e sofisticadas
técnicas, não há dúvidas, mas, infelizmente, para, no final das contas, fazerem
a mesma coisa de sempre: alienar, treinar, aniquilar consciências, facilitando
a exploração, a centralização de regimes e domínios, dando a isto uma faceta
aparentemente humana, socialmente justa, e, acima de tudo, democrática
(Migliori, 1993).
Entendemos que as atuais dimensões da sociedade requerem, também, uma
outra filosofia de educação e uma outra proposta de escola radicalmente
diferente do que a que aí está e com a qual, covardemente nos acostumamos. Que
estabeleça novas relações entre professores e alunos e uma concepção
diversificada de conteúdos, ciências, conhecimento e aprendizagem. Em essência,
a escola não evolui. Ela foi feita para isto: a estagnação, a segregação.
Legitimando no seu cotidiano, as injustiças sociais mais grotescas para os
tempos de hoje. Deste modo, as escolas, assim como estão constituem um mal ou
um bem? Aí temos uma boa reflexão. Elas mais atrapalham do que ajudam na tão
esperada evolução da sociedade. Pois, refinam e eternizam dissimuladamente, a
ganância, a exploração, a desordem. E disto, nós educadores deveríamos nos
envergonhar. Mas, ainda não tomamos nem conhecimento de tal realidade de que as
escolas mais conformam e deformam, do que, propriamente, formam seus alunos.
Trata-se, como já dissemos, de um problema paradigmático. Ao mesmo
tempo, metodológico, filosófico, político, operacional, ou seja, um problema
que envolve todos os aspectos e esferas a um só tempo e que requer, para a sua
solução medidas e princípios aplicáveis, no mínimo, do mesmo modo. Não dá para
solucionar problemas gerais e tão amplos com medidas segmentadas e partidas
como insiste, há décadas a forma de gerir e administrar a educação e a escola,
o que, cegamente, as universidades ensinam, justificam e adotam, frente aos
seus fins eminentemente burgueses e inconfessáveis. E, conforme o
percebemos, a partir dos seus pressupostos ideológicos, ainda crus,
embrutecidos desde a idade média. A questão é ampla e difícil, envolvendo
teoria, prática e práxis. O que está muito além da mera aparência. Trazendo
constatações filosóficas, éticas, políticas, sociais, humanas, além, é claro,
daquelas marcadamente, econômicas. Sendo esta a complexidade que denominamos de
paradigma, e, para muda-lo é que aqui buscamos e propomos novos caminhos,
outras alternativas.
Tais problemas tomam dimensão de desafio na superação do dilema: como
formar pessoas que pensem que participem, que argumentem, que construam a
realidade com a qual sonham e, ao mesmo tempo sejam servis, obedientes e
serviçais à causa dos comandos hegemônicos que aí estão? O remanescente
capitalismo selvagem, explorador e periférico precisa de pessoas que pensem,
reflitam, saibam, mas que sejam, igualmente, facilmente exploradas, omissas e
subservientes. Aí caímos num mistério e num desafio dialético impossível de
serem solucionados pela nossas limitadas lógica e razão. Está fora de cogitação
constituirmos este duplo milagre sendo, justamente, desta ignorância que
padecem as escolas e seus comandos, daí a eternização dos problemas e do caos.
Aí passamos por um momento crítico em que se vislumbra a profunda
necessidade de reorganização dos conhecimentos, com outra dimensão bem mais
complexa, buscando, assim, um Paradigma Novo e quando falamos disto não estamos
nos referindo às inquietas repetitórias das meias mudanças educacionais e
pedagógicas que são a forma mais eficiente de não se mudar nada. continuando a
mesmice menos que ridícula.
As pesquisas e o bom-senso têm demonstrado que os investimentos que
precisam ser feitos são aqueles marcadamente afetivos, humanos e emocionais,
calcados, sim numa perspectiva crítica e política também radicalmente nova -
sem o que, aliás, de nada adiantarão. Uma vez calcados na consciência
político-ideológica do que, como e para que fazer em educação. Remodelando as
práticas pedagógicas e curriculares em todo o seu âmbito. É preciso que tenhamos
consciência do para que e para quem; contra o que e contra quem podemos estar
trabalhando enquanto educadores. Vivemos, ainda, sob um emaranhado
técnico, metodológico e operacional que já deu suas contribuições possíveis.
Sendo fundamentado para ser posto em prática nas dimensões e momentos
históricos já vencidos e superados. É, portanto, necessário mudar.
Revolucionar, quebrar o arraigado senso-comum. Adotando, por fim, um
novo paradigma melhor e mais crítico, aberto, dinâmico, humano, sistêmico, flexível
- falamos, portanto de uma verdadeira revolução cultural na educação e na
escola e, não mais, de antiquadas, babentas e mancas pequenas mudanças que
precisam de bengalas e óculos, e mesmo assim de nada servem e não levam a lugar
algum. Propomos uma revolução cultural que busque, por
si, a felicidade de todas as pessoas. Sem o quê, podemos estar fazendo tudo,
menos, educação. E os avanços do nosso tempo não mais permitem aos educadores
tamanhas omissão, covardia, enfim, ignorância política.
O modelo educacional que temos não serve às transcendências milenar e
secular em que estamos vivendo. É preciso reverter não só a ordem, como também
a filosofia, os métodos, os princípios e os valores. Os componentes todos
que se mostraram eficazes até agora, estão dando sinais da mais absoluta
necessidade de superação, de substituição por outros mais eficientes e
eficazes, definindo a complexidade de quem educa quem e para quais fins no real
concreto da sociedade isto é feito. A centralização do poder, o raciocínio
linear, a manutenção dos privilégios de poucos, a partir das concepções
normativas de uma competição arraigada e inconsciente precisam ser
suplantados em todos os setores da ação humana, sendo, na educação é que o
passo inicial deve ser dado pois é nela que eles são apreendidos para que sejam
implantados na prática social em todo o curso da história da humanidade
(Chomsky, 1995).
Assim, aluno que aprende construindo, aprende a construir e o que
aprende com o já pronto e construído aprende a se omitir, se acovardar dentro
da zona de conforto que é criada de conformidade com as condições e a realidade
de cada pessoa. Sendo esta, embora no meio de um monte de subterfúgios
técnicos, a forma de educação que temos E, assim, para aprender a
reivindicar, questionar, criticar, mudar. Constituir seus sonhos e
desejos. Tornando-se agente de sua história pessoal e social temos que, da
mesma forma, transformar os meios e as formas de se fazer educação. A energia
planetária clama pelo equilíbrio na distribuição dos bens, dos direitos e do
resgate da qualidade de vida de todos. E, embora as elites sequiosas por ter e
pelo comando, ainda teimam em aperfeiçoar seus estilos de competir e ganhar
sempre: daí a imposição de fórmulas educacionais nocivas, inumanas e ainda hoje,
mantidas. Enquanto que o instrumento preciso e inadiável é a cooperação entre
todos e por todos. Numa abordagem muito mais ampla, complexa, coerente. É,
encima de tais proposições, que devemos nos debruçar com a máxima urgência.
Existe aí uma linha tênue e invisível que define ideologia, educação e a
constituição da chamada nova ordem mundial em seus valores teóricos e práticos.
É o que nos diz Bordenave (1972). Conduzindo, assim, as condições de vida das
pessoas. O que só pode fazer perpetuar a exploração, a fome, a miséria, o
pensamento e a ação humana contra a vida e a natureza, em síntese, o caos que a
humanidade, sem que saiba, premedita em quase tudo o que faz. Ensinar e
aprender são princípios e definições marcantes e definitivos neste grande processo
que é a vida e as suas circunstâncias todas. O que fica, patentemente
demonstrado nas inúmeras pesquisas que são feitas por estudiosos e instituições
mundialmente respeitáveis, como podemos constatar a qualquer momento. O que nos
dá a certeza de que a forma de se educar as pessoas é ponto fundamental na
definição dos rumos e do destino do planeta. Pois atua, por si mesma, na
construção da personalidade dos seres que nele vivem e que conduzem a sua
história pela ação, a destruição, ou mesmo, se omitindo em fazê-lo. E tudo isto
é o resultado de como cada um se educa, ou, em última análise, é educado mais
diretamente pela escola, o que se completa com as relações com o mundo, a
cultura, a mídia, a religião, crenças, valores, ética, etc. E que depois, alia-se
à corrente humana, em princípio, amorfa, mas na verdade, é a diretamente
responsável por tudo o que acontece - ou deixa de acontecer. E esta é uma
matemática simples e para entendê-la, havemos de deseja-lo profundamente. Mas,
pelo que nos parece, ainda não é o caso. A maioria dos educadores não acordou
para isto. E os poucos despertos não estão, nem estarão, nem a curto, nem a
médio prazos, suficientemente preparados, tal a gravidade da situação com que
lidamos.
O paradigma da elaboração unificada de políticas, diretrizes,
administração educacional, práticas educativas e curriculares, sendo tudo
definido e construído por todos é o caminho possível para a busca da solução
para os problemas da educação formal das pessoas e da vida no cotidiano das
escolas. A saída é pela construção coletiva de todos os processos educativos em
todos os momentos e lugares sociais. Falamos aqui de educação para abrir, e,
não, para filtrar e manipular consciências, criticidades e possibilidades
outras de intervenção no mundo. Portanto, conforme nos lembra Freire
(1992), os princípios norteadores de conhecimentos interessantes e interativos
ao contexto vivencial de quem ensina e de quem aprende validam esta
experiência. O uso de metodologias promocionais e assertivas complementa a
caminhada. Avaliação e promoção humana para construir seres humanos mais
inteiros abertos, críticos, perspicazes, vivos e felizes, são talvez as
conquistas mais urgentes, importantes e necessárias que devamos fazer em
educação. E não mais, aperfeiçoar as metodologias avessas a tudo isto,
falamos de mudança, e, não, de meros aperfeiçoamentos, inovações,
meias-verdades que em nada contribuem, servindo apenas para enganar.
E só então, partirmos para os embates mercadológicos, econômicos e
trabalhistas, cuja importância, é claro, não podemos negar. Mas, tais elos se
articularão harmoniosamente, respeitando a inteligência e as formas naturais de
aprender e de se educar das pessoas, sem desrespeitar as suas contingências
inconscientes e intelectivas, de forma tão brutal, como a educação tem feito,
aliás, com invejável competência. Devemos trabalhar para isto, sim, mas,
somente, a partir da construção de personalidades mais inteiras, íntegras,
humanas, competentes e solidárias frente às exigências do momento histórico em
que vivemos e suas perspectivas futuras. Este é, a nosso ver, o objetivo; a
grande meta da educação com a qual, sonhamos. Dizemos que fazemos, mas, negamos
tudo nas nossas práticas e táticas. Na medida em que “estupramos de
forma muito mais do que cruel” nossas cabecinhas inocentes, no
ímpeto de prepará-las para o mesmo mercado que renega as suas vidas e as
consome enquanto mata a criatividade, o senso crítico, o lúdico, o sentimento,
enfim, o ser político, deixando-o amorfo, apático, ao dispor de explorações
outras.
Ao longo de seu processo histórico, a educação, por meio de suas
instituições, mecanismos, recursos e legislação tem primado pelo exercício
exclusivo da qualidade formal, e, esta, nós não podemos negar. Pois ela aí está
a olhos vistos, por meio da ordem, da disciplina, da limpeza das instalações,
das filas quase perfeitas, no cumprimento dos horários, nos diários de classe sem
nenhuma rasura, os uniformes escolares impecáveis. O que, na verdade, traduz a
qualidade do se diz que faz. Mas falta a essência, a qualidade política, aquela
que define os porquês, para que, para quem e contra quem se faz. A educação
formal serve, tão somente, para legitimar e camuflar a opressão do Estado:
alienar as pessoas e adequá-las aos regimes, domínios e imposições. Em síntese,
escola e educação congregam a escravidão moderna, a escravidão de acrílico de
que nos fala Gadotti (1997) quando cita o seu refinamento por meio dos
controles dos mercados e dos regimentos trabalhistas legais dos tempos de hoje,
que, se analisados com sabedoria e sensibilidade, perceberemos o seu lastro
escravagista jamais superado.
Por outro lado, existe uma certa cegueira conceitual e prática por parte
de seus agentes e usuários que se mantiveram meio que conformados e satisfeitos
com seus processos, por séculos a fio, sem entenderem os seus revezes. E isto,
pelo menos, historicamente, deve chegar ao fim com o advento do terceiro
milênio, da chamada era do conhecimento. A qualidade formal deverá associar-se
à qualidade política, em que aparência e essência deverão ser circunstâncias
conjugadas, tanto na teoria, quanto na prática. Levando, portanto, à práxis
desejada e necessária para que a vida persista com níveis de qualidade
proporcionais para todos.
Não haverá mais espaço para apenas se dizer que faz, como aprazem até
hoje, os educadores cínicos e céticos; os negocistas que transformam a educação
em mercadoria vendida diretamente nas instituições particulares, ou, pior
ainda, paga com o suado dinheiro dos tributos e impostos saqueados do cidadão
que trabalha, no caso das escolas públicas. Não basta mais o discurso da escola
transformadora e cidadã. Ela terá que, para isto, colaborar, de fato, para a
transformação da cidadania, em termos qualitativamente, aceitáveis: trabalhando
para todos e, não, apenas para aqueles que comandam os regimes. Usando, desta
forma, de subterfúgios, métodos e teorias absolutamente enganadoras. Cometendo
algo maior que um crime, o que não se descreve dentro da nossa legislação
fraca, ultrapassada e, eminentemente, pequeno-burguesa à qual não interessa o
entendimento profundo de tais questões, por motivos mais que óbvios.
E isto prescinde de mudança, de planificação dos novos paradigmas. E
aqui apresentamos uma das muitas propostas dentro das infinitas linhas de
pensamento que existem. Durante todo o tempo a educação se firmou em bases,
essencialmente, elitistas e impositoras. A bem da verdade, a educação formal
existe para inculcar em todos as ideias e interesses dos poucos que comandam os
ditames da vida; o que deverá sofrer uma transformação radical em todas as
instâncias. E, portanto, os modelos de escola e de educação que temos, já não
servem mais, o que, infelizmente, ainda não é percebido pela vasta maioria dos
educadores, mesmo os mais sensíveis e bem preparados. Pois a onda é muitíssimo
complexa e mesmo as boas universidades, os excelentes autores e pensadores
ainda não conseguiram chegar lá. E demorarão muito a fazê-lo. Talvez nunca
tamanha a demanda do capitalismo extremo, este câncer da sociedade.
A escola deverá atuar mais pró (como diz que faz), e, não contra (como
faz) aos seus servidores, classe trabalhadora e seus usuários gerais diretos
(alunos) e indiretos (comunidade e classes sociais diversas a que julga
servir). E não mais, como se repete na história e no tempo de todos os homens e
mulheres: inculcando a moral escrava que legitima diferenças, mantém
privilégios brutais e dá a tudo isto legitimidade e aceitação por parte da
absoluta maioria “supostamente educada”, mas, “vergonhosamente enganada”, pela
escola e a educação que temos e que deveriam se ocupar em transmitir e
produzir conhecimentos e saberes que sirvam, de fato, a cada indivíduo e a
todas as instâncias e demandas sociais. É de que nos fala Brandão (1980) quando
retrata que elas se ocupam de instrumentalizar uns a serviço de outros.
Culminando na perpetuação dos regimes impostos por sistemas e realidades que
queremos transformar. E afirma ainda que ao contrário do que acreditam seus
agentes, a educação exerce sua tarefa numa sistemática absolutamente
antagônica: perpetuando o que deseja mudar. Chegamos a um tempo em que educação
e escola precisam deixar de ser cínicas e imaturas em relação ao que fazem. O
que, na verdade, dificulta e inibe os resultados que delas se esperam. Enquanto
os educadores, “altamente preparados” continuam como “criaturas tontas” fazendo
a mesma coisa e esperando que tudo seja diferente.
Nossa concepção consiste em partirmos do caos para revigorarmos
políticas, diretrizes e propostas na operacionalização de um novo fazer
pedagógico. Mas, sim, de forma radicalmente nova, diferente, não só no discurso
e muito menos, se utilizando dele para, justamente se negligenciar as práticas
pertinentes. Tudo não passa de um embuste, de jogo de palavras, de um conjunto
de concepções mentirosas e infiltradas nos surpreendentemente atrasados meios e
ambientes educacionais. Pois, disto, já estamos todos muito mais que exaustos.
Mas, culminando numa práxis diferenciada. Restaurando a qualidade de vida em
termos concretos. Sem o quê, não estamos, em absoluto, educando
ninguém. Por ora, a educação se mantém por detrás de um discurso
escorregadio que tenta – mas nem sempre consegue – ocultar as raízes de sua
própria crise, do seu fracasso histórico. Enquanto isto, o caos se perpetua e
se agiganta. É preciso, portanto, transcender a tudo isto e se começar a educar
sobre novas bases. Concretizando outra realidade, novo poder, novas relações.
Solidificando e solidarizando o viver com dignidade. Ajudando a restaurar, de
fato, a melhoria contínua da qualidade de vida humana em sociedade, ou seja,
para todos (Mafesoli, 1997).
Ensinar e aprender os saberes necessários a uma vida, substancialmente,
melhor. Criando e implementando, técnicas, métodos, objetivos e gestão que
facilitem a esta modalidade histórica do que seja educar as pessoas. Tornando
transparentes e vivas tais razões e tais momentos. Reconduzindo a humanidade em
função dos novos tempos e das exigências vivenciais de um mundo, a cada dia,
mais caótico e tumultuado, o que, toda educação não pode se dar ao luxo de
ignorar, como aliás tem feito. É preciso transcender, iluminar e conduzir
para esta prática que valorize a vida e contribua para que se exterminem as
diversas formas de exploração. Construindo reais companheirismos; verdades para
além da ciência fria e estereotipada por uma certa ordem que não serve mais a
ninguém. Sendo compulsória a necessidade de transformação. A saída do modelo
cartesiano de pensar e de fazer educação, para uma proposta aberta, sistêmica,
proporcional, integrativa, harmoniosa, lúdica, feliz, em síntese, mudando os
paradigmas. O que requer uma atitude revolucionária – sem o pavor desta palavra
que, geralmente, temos, pela nossa pequenez, ignorância e covardia – de todos
os que, direta ou indiretamente, atuam neste processo.
Necessário se faz a percepção de pequenas coisas, enfim, sutilezas do
cotidiano da escola e a brutal crueldade – concreta, simbólica, psicológica ou
política – de certas exigências, normas e regras. Mais uma vez refletir sobre a
essência e da necessidade de trazê-la à tona. Fazendo-se presente e real, e,
não, como mera circunstância que, se por acaso ocorre, é, sem dúvida, para a
insatisfação de muitos, tal o nosso atraso conceitual e prático neste sentido.
Só assim é que estaremos começando a pensar na verdadeira educação para
concretizá-la por inteiro. Sem os paradoxos neutralizadores que veem
eternizando suas crises, o seu fracasso desgastante e o seu pleno insucesso no
sentido de se preparar as pessoas para enfrentarem com dignidade as agruras da
vida, e, se possível e necessário, transformar as relações dos seres com o
mundo que os cerca (Habermas, 1990).
O educar passa, assim, a ser e ter uma função da maior importância para o presente e o futuro da humanidade, em seu caráter formal ou informal. Sendo mais do que o responsável pela simples materialização de relações em contínua evolução entre os seres humanos e os novos saberes e o seu fazer na sociedade passa a transcender valores e culturas outras. Enfim, modificando as pessoas e suas mentes no sentido de melhorá-las, na medida em que passam a entender a fundo o real concreto que as cerca em todas as dimensões. Aí sim, começamos a falar de educação. E não, da mera instrução funcional e comprometida com a ideologia de poder no exato sentido de mantê-la e ampliá-la nos moldes avessos da exploração que aí está. Que é, sim, o que as escolas têm feito. Deixando, marcadamente, uma horrenda defasagem histórica, na medida em que seus agentes são desconhecedores de tal fenômeno. Sendo apenas isto o que precisa e deve ser superado. E, todo esforço feito neste sentido ainda será pouco sendo necessário um brutal esforço que ainda espera pelo passo inicial.
É necessário compreender que como seres vivos – mamíferos e de sangue
quente como tem sido feitas as modernas conquistas da antropologia – nós
competimos sempre uns com os outros, seja, consciente ou inconscientemente. O
que, pela educação e por meio de sua instituição oficial, a escola; o fazemos
de forma implícita e politicamente dissimulada, sem que entendamos tais
minúcias. A formação dos educadores quer nas licenciaturas ou pedagogias –
diríamos que nestas, até especialmente – encarrega-se de criar este muro
divisor entre uma coisa e a outra. O que é feito com espetacular competência e
de maneira muito mais que eficiente, nas faculdades de educação alheias ao
processo de evolução histórica da mesma sociedade. Elas são, sob medida,
alienadas politicamente, o que faz parte de uma ideologia milenar de construção
de ricos e pobres, de empregados e patrões, de proprietários e consumidores,
cuja máxima exploração é que garante o acúmulo da riqueza e o eterno bem-estar
de quem comanda. E isto a escola dramatiza e dissimula o tempo todo dentro do
jogo que faz, da disciplina que impõe, das estratégias inumanas que usa.
Licenciados e pedagogos tornam-se verdadeiros analfabetos neste sentido e
tornam-se, conforme Nieskier(1982) verdadeiros cães de guarda da burguesia
dentro e fora das instalações da escola, vigiando, rosnando e mordendo
mortalmente quem se atreve a se iniciar contra seus dogmas. Tornam-se inocentes
políticos e vítimas fáceis, à medida que se enchem de técnicas e teorias que
são manipuladas como recheios mentais para isto.
E se não vencermos esta batalha estaremos esmurrando o vazio quando
falamos em busca de solução para os problemas educacionais de hoje em todo o
mundo. Sei que muitos educadores ao lerem estas linhas terão o tradicional
arrepio na espinha. Terão nojo, asco e até vomitarão de repugnância. É que os
trabalhadores funcionais da educação têm sempre, diante desta verdade, a mesma
reação dos vampiros que, nas ficções de terror, quando se veem diante da cruz.
Mas não sabem – os educadores – que tudo faz parte dos prenúncios ideológicos
de um mundo burguês, centralizador, repressor e periférico que insiste em
continuar vivendo dando a poucos o poder de explorar e confundir muitos,
usando, sem escrúpulos, educação e educadores para tal. Assim, como nas nossas
tradicionais salas de aula, por exemplo. É só uma questão de arregalar
criticamente os olhos para enxergarmos. Qual o sentido real de grande parte dos
conteúdos que ensinamos? Por que se muitos alunos não respondem, nas provas ou
lições diárias, o que quer, pensa ou dita um único professor é a maioria que é
punida, rechaçada, reprovada, expulsa? Por que as salas de aula são
classificatórias, com primeiros, segundos e últimos? Não estariam aí ocultas
lições de desigualdades e de uso abusivo do poder que se reproduzem do lado de
fora da escola, ou seja, no real concreto da vida de todos nós?
Mas ouse, se for capaz, discutir isto com professores ou pedagogos.
Leve, se tiver coragem, tais questões para os encontros, os congressos de
educação, as reuniões pedagógicas, ou até mesmo para os sindicatos da classe preparadíssimos
para os jogos dissimuladores. Grande parte dos seus agentes são pagos pelo
governo, e, evidentemente, cumprindo o seu desejo, mesmo debaixo de uma mácula
tendenciosas de discursos e falas belos e edificantes. Certamente, quem fizer
isto – como eu, agora – terá motivos de sobra para chorar, se arrepender. Se
amargar na solidão e ser excluído dos ditos ambientes educacionais caóticos,
confusos e perdidos nos becos mofados da história. É que os educadores –
especialmente, os cristãos – como diz-nos Russel (1972), não se cansam de
crucificar e destruir seu mito maior para depois santificá-lo em templos, se
passando pública e mediocremente, por seus bons filhos, os benfeitores das almas,
os salvadores dos homens e do mundo.
Já deveriam fazer parte do passado os tempos em que a educação e o
ensino poderiam ser caracterizados como espécies de “camisas de força”. Atuando
num processo de contínua manipulação, neutralizando, desejos. Deveriam, tais
processos, ser, hoje, personalizados, lúdicos. Transcenderem felicidades,
sendo, politicamente, assertivos. Ou seja, realizados em favor de todos e para
o proveito real da humanidade, o que requer uma profunda reversão do que é, de
fato, feito. E não, de meros aprimoramentos. Mentiras técnicas que são contadas
com rigores e metáforas que levam-nos a acreditar nelas. Repetindo,
viciosamente, os mesmos ciclos amargos dos destinos da história das
civilizações. Deveriam estar fundamentados nos direitos humanos plenos, na
alegria, no prazer de se contribuir, de fato, na construção da própria
história. Para dela se usufruir, vivendo de forma próspera, bela, cidadã,
confortável, e, principalmente, solidária.
Assim, poderíamos, então, começar a pensar e a fazer acontecer, saberes,
métodos, técnicas, formas de avaliação, gestão escolar que possam convergir, de
fato, para um, ainda utópico processo educativo: o de buscar e contribuir para
que germine dentro de cada pessoa todo o seu teor evolutivo. Tornando-a capaz
de uma reflexão e ação conscientes que fluam a serviço do todo e de todos.
Fazendo melhor o mundo por meio de nossas melhorias próprias. Afinal,
educar não é só enfiar na cabeça das pessoas as letras, os fragmentos das
artes, da história, geografia, línguas, literaturas. Fazer reproduzir sílabas e
números, agrupá-los e sistematiza-los. Isto é instruir. O que é,
miseravelmente, pouco frente a complexidade do ser humano a ser cultivada e
florescida para dar frutos numa educação de verdade. Mas disto, a absoluta
maioria dos educadores está muito longe de desconfiar, muito menos, de conhecer
– eles foram preparados para não enxergarem tal fato. Nisto nossas
universidades e faculdades de educação são muito eficientes. E tal superação
consiste num desafio interminável. Que é marca de conflito, de luta, de
transformações radicais, em síntese, de adoção dos tão discutidos novos
paradigmas.
O que significa na prática, ao menos buscar, por meio do exercício
educativo formar indivíduos inteiros e contextualizados à dinâmica do mundo.
Relativizando as condições, evidentemente, cronológicas, históricas e sociais
de cada indivíduo. Daí a complexidade, a diferença, a personalização que,
arduamente, defendemos e que devem estar presentes em todos os momentos do processo
educativo que mereça esta denominação. Se tal meta não for cumprida, a educação
não existe é neutra. Uma ação social nula, vazia, dispensável, e, por isso
mesmo, desvalorizada, inclusive, profissionalmente. Tornando comum e normal em
termos macro, as contingências e problemas salariais e trabalhistas, cujas
discussões ocupam todo o espaço de tais categorias. Mas elas deveriam, antes,
corrigir suas falhas gritantes, gravíssimas e, historicamente, acumuladas. Pois
até agora, são regiamente pagas considerando a pouquíssima qualidade dos
trabalhos educativos que realizam. Sejamos honestos e coerentes com o que
gritamos aos quatro ventos para que o mundo nos ouça.
A educação e os educadores precisam deixar de formar, ridiculamente, as
elites capitalistas exclusivistas e os ingênuos servidores destas. Os
portadores de uma certa subserviência crônica, em absoluto descabida para os
tempos de hoje. A palavra de ordem em educação é, por ora, a busca do
equilíbrio entre os pólos articuladores das várias realidades vivenciais que
integram seus muitos aspectos: individuais, sociais, culturais, políticos,
ecológicos, dentre outros. E fazê-lo para todos os seres vivos é aí que mora a
diferença que renegamos em entender. O que, por sua vez, nos leva a acreditar
que buscamos cumprir a pluralidade democrática tão antiga no discurso,
mas ainda por vir no real concreto da vida das pessoas. E tudo gira em torno de
um atraso estarrecedor, embora as aparências possam nos enganar. Cabe à
educação e à escola desenvolver mentes em evolução tão complexa para tal
enfrentamento vivencial, saindo, portanto, da vergonhosa mediocridade que ainda
praticam ajudando a deformar mentalidades, a eternizar subserviências
perpetuando no ter e no poder as burguesias ridiculamente materialistas e
exploradoras dos trabalhadores, das massas populares: uma vergonha sem
precedentes.
Pensando, sistematicamente, a educação, não há como diferenciar, de
forma mais ampla, programas, ações e currículos. Pois, tudo se define por uma
axiomática comum e transdisciplinar entre políticas, diretrizes, filosofia,
planejamento e ação. Tudo num só bloco, como partes que harmônica, e,
ativamente, se complementam. Assim como deveriam ser as mudanças educacionais.
Não podendo, na verdade, ser operadas de forma estanque e, nem mesmo, gradual,
mas simultânea: gerando choques, sustos, provocando o que poderíamos chamar de
uma revolução cultural necessária e muito mais que urgente (Postman, 1986).
Neste prisma, entendemos que ciência, educação, óticas novas,
tecnologias diversificadas, modernidades outras e tudo o mais que se insere
neste contexto caminham para a unidade em busca da perpetuação da vida.
Redefinindo os valores necessários e tornando mais translúcidas as soluções
para os problemas comuns existentes. Para o que, faz-se necessário colocar um
fim definitivo nos comodismos e nas subserviências dos educadores por meio de
ações mais conscientes. Afinal, acreditam-se que nós, educadores, somos, até
por força de lei, suficientemente, preparados para tal. Formamos uma legião de
intelectuais, de graduados para o exercício de tão nobre função. Devemos,
então, agir como requerem a dinâmica do mundo atual e as perspectivas do
terceiro milênio, da era do conhecimento, dos valores humanos, da pluralidade,
da decência, das conquistas dos direitos humanos mais nobres, tão em moda como
nunca estiveram antes. Tudo no mundo civilizado acontece a partir dos
rumos e comprometimentos ideológicos, no sentido de se mostrar como justas e
normais todas as maneiras de exploração, o uso abusivo do poder, a concentração
da riqueza e dos privilégios nas mãos de poucos. O que se torna impossível, sem
o uso, o abuso e a exploração de muitos; sobretudo, da classe trabalhadora, dos
mais humildes, ingênuos e carentes. É assim que se dão as fábricas das leis,
dos registros, domínios, estatutos, contratos. É a forma como se constitui a
comunicação, a religião, a crença, os valores, a família, as organizações,
enfim, tudo.
Conduzem-se as relações humanas para justificar o domínio, o bem-estar,
o poder, o status quo dos que dominam o mundo. Na educação não é só assim, como
dela é que emanam todos os demais processos para a definição de como se
legaliza e se coloca em prática a vida, seus encantos, misérias, dores,
conflitos em todo o seu cotidiano. Tudo respira ideologia com base no
comprometimento com as elites, com o poder. E, claro, a educação, a escola são
os elos onde tudo isto se define. Portanto, elas trabalham contra a vida e a
favor do poder. Contra o ser humano e em benefício do capital, seus construtos
e benesses. Escola e educação atuam contra quem pensam contribuir. Para o quê,
inclusive, manipulam e justificam o uso de técnicas, métodos, programas e ações,
que se fundamentam no blefe, no engano, na mentira. Elas ajustam o ser humano
para a legitimação do caos. Pois, ele, sendo eterno faz com que se perpetuam
benesses e privilégios, para quem, supostamente, se protege e se mantém, ainda
que temporariamente, fora da sua esfera.
Nós, educadores, ao contrário do que acreditamos, somos, mesmo, os
algozes do mundo. Os dificultadores da vida, legitimadores da dor e do conflito
que tanto padece a humanidade desesperada e pedindo por socorro. Saber e
acreditar nisto é só o início do diagnóstico, que, embora nefasto é bem mais
que necessário como ponto de partida para a recondução da história da educação
rumo ao que acreditamos buscar dentro desta importante área do saber e do
fazer humanos. Mas ainda falta muito, talvez tudo. Arregacemos, portanto, as
mangas. Respiremos fundo e partamos juntos para o passo inicial. Pois, temos
ainda pela frente, uma caminhada bem longa, talvez suada e com muitos
sacríficos, aos quais, talvez a maioria de nós não resistirá. Não acredita na
sua necessidade. E não podemos de nenhuma maneira, continuar assim, tão
ingênuos e inocentes úteis a tais revezes. Mas este precioso embate será
repleto de bênçãos e nos conduzirá rumo à luz que alimentará nossos corpos
e almas. Dando-nos o melhor de todos os presentes, que, como bons
educadores, passaremos a merecer: a consciência tranquila do dever cumprido. E
a certeza de sermos atores na construção da história humana que, embora não
saibamos, mas ainda nos mantemos na contramão. Coibindo, talvez, a cidadania, a
dignidade humana que julgamos construir. E o tempo presente é, para, no mínimo,
acordarmos. Tudo não passa de uma questão de cegueira, ou uma questão de visão
e como num processo absolutamente individual, a escolha só pode ser minha, sua,
de cada um.
Referências Bibliográficas:
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