Lua Minha
Agora
eu sei que jamais estarei de novo sozinho
no
mundo ou na vida.
Numa
noite destas de solidão, aí pelos meus
andares
chutando latas, olhei pro céu
e lá
estava ela: loura, redonda, iluminada.
Sorria
pra mim com seus dentes largos
e a
cabeleira loura, esvoaçante, ao vento.
Brincamos
de bailar, de pega-pega, de passar anel...
E, de
vez em quando, desaparecia por detrás
de uma
nuvem travessa, mas ficava cantarolando baixinho
como o
gato que se esconde mas deixa a cauda à mostra.
Só pra
ser encontrada logo e me fazer rir,
e
tornar-me outra vez menino
cheio
de luzes e de alegrias.
Não
tive como me despedir. Ninguém teria.
Num
salto, num quase vôo,
pude
apanhá-la inteira.
E
agora, a tenho comigo, pra sempre.
Iluminando
meus cantos, meu quarto, minha vida.
Ela
deita-se comigo sob o cobertor comum,
e, de
vez em quando, debaixo do meu travesseiro
e
trás-me de presente os sonhos mais belos.
Me faz
virar peixe, voar como borboleta,
ser
bicho do mato, folha de grama,
pingo
de água, ter gosto de amêndoa,
cheiro
de hortelã, de madressilva, estas coisas.
Num dia
desses, foi longe e me fez ser estrela
para
brilhar junto com ela.
Eu era
a companhia para a melhor das festas,
no céu,
no meio dos santos e dos anjos.
A
virgem Maria estava especialmente
maravilhosa
nas suas vestes longas, a um só tempo puras,
mas
demasiado ousadas,
num
misto de tudo o que é belo e bom
e que
se arrastavam no chão do paraíso,
e, de
tão simples, exalavam o cheiro das rosas
feitas
por Deus, o seu filho,
o dono
da festa, cheia de incensos
e de
delícias outras.
Apenas
sentidas, mas não, explicadas,
para o
quê, não existem palavras. Nem gestos.
De
tanto dançar e me divertir com aquela gente
eu
amanheci cheio das coisas boas
e me
contaminei de cada uma delas
que
passaram a fazer parte de mim
e nunca
serei mais o mesmo...
...Ela
é prestativa que só.
Chama
por mim ao amanhecer, me acorda, docemente,
com seu tom de anjo, tocando de leve o meu rosto
com o
seu dedo de veludo azul.
me
desadormecendo sem susto, sem ruído,
mas num
sussurro sereno e terno.
Depois,
é quando vai pro seu canto,
bocejando
como um anjo travesso
destes
que passam as noites em claro,
apreciando
as farras, as madrugadas.
Ela vai
dormir quentinha e me esperar escondendo o segredo
que só
nós dois conhecemos.
Pra começar, quando eu chego, as cócegas noturnas.
As
risadas de desmaiar, de desfalecer, de levitar de emoção.
E eu
não mais soube o que é tristeza, dor, solidão, saudade.
Nem
precisei dos amigos humanos,
só do
meu cachorro ciumento, bravo,
latindo
e uivando quando ela me toca, abre seu
olhar e seu sorriso.
Trouxe
a lua pra morar comigo
e
passei a me chamar felicidade.
(Do meu livro mais recente: Poemas para os anjos da terra. Publicado pela Ed. Kelps, Goiânia, 2011).
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